quinta-feira, 16 de junho de 2011

bom senso ou lógica?

Muitas vezes, o que é considerado "bom senso" vai sensivelmente contra ao que levaria uma análise lógica, mais racional. Exemplos disso são muito comuns, mas por conta de assuntos que precisei aprender recentemente, dois casos específicos me ocorreram.

1- Imagine uma eleição para governador de Estado. Os candidatos são João, José e Joaquim. O total de votos válidos nesse Estado para essa eleição foi de 100 mil votos, tendo João ganho a eleição, no segundo turno, contra José. Algum tempo depois, o TSE descobriu irregularidades na candidatura de João, impugnando o seu mandato. Qual a solução? Toma posse José, o segundo colocado na disputa eleitoral. Nada mais correto, correto?

Errado. E não, necessariamente, do ponto de vista jurídico, mas do ponto de vista lógico.

Ora, a maioria da população escolheu um candidato (João). Depois, apurou-se que o processo não foi válido, por conta de irregularidades, portanto esses votos não poderiam ser computados. Atribuir o resultado da eleição sem considerar os votos de quem votou em João (a maioria) é tomar uma decisão alijando a maioria da população do processo! Nada implica em que, estando João fora do páreo, José (e não Joaquim, o terceiro colocado), fosse eleito. Para deixar o argumento mais claro, vamos exagerar o exemplo. Imagine que João houvesse sido eleito com 80 mil votos, ficando, respectivamente, em segundo e terceiro lugares, José, com 12 mil votos, e Joaquim, com 8 mil. Ora, excluídos os 80 mil votos de João do processo, a diferença de 4 mil de José para Joaquim é insignificativa perto dos 80 mil votos que foram impedidos de manifestar sua decisão.

Recentemente, o STE decidiu pela eleição do segundo colocado em eleições onde o vencedor foi impugnado. Deveriam ter sido convocadas novas eleições, obviamente sem a presença do candidato impugnado.

2- Nas eleições para deputado funciona o tal do sistema proporcional. Divide-se o total de votos válidos (excluindo-se os nulos e brancos) pelo número de cadeiras a ser preenchidas para achar o Quociente eleitoral, e o número de cadeiras que cada partido vai ocupar é quantas vezes o número de votos desse partido alcançou esse Quociente. Vejamos um exemplo: imagine que, em um estado, há 30 cadeiras a ser preenchidas e 90 mil votos válidos; o Quosciente eleitoral será, então, de 3 mil votos. Imagine que partido A e partido B consigam, respectivamente, 5 mil e 61.500 votos; em uma divisão que desconsidera o "resto", o partido A ocupa uma vaga só e o B ocupa 20. Mas o que se faz com o resto da divisão? Excluindo-se o resto sobram cadeiras a ser ocupadas, - como computar quem fica com as sobras? A solução que melhor se apresenta é um "arredondamento", privilegiando a quem falta menos para chegar no número inteiro. Nesse caso, ao partido A faltam 1000 votos para alcançar mais uma cadeira, enquanto faltam 1500 ao partido B. Seria natural que a cadeira adicional ficasse com o partido A, certo?

Errado. No Brasil, o método é o das "médias", que faz total sentido. Soma-se a cadeira adicional ao número de cadeiras já conquistadas pelo partido e divide-se pelo número de votos já conquistados - quem tiver maior média de "votos por cadeira", leva. Nesse exemplo, Partido A = 5000 / (1+1) = 2500; Partido B = 61500 / (20 + 1) = 2829; como a média do Partido B é maior, ele leva a cadeira adicional. Faz sentido porque, nesse caso, ambos partidos "ganhariam de lambuja" alguns votos; só que a proporção desses votos "doados" é muito menor ao partido B (2,4%) do que seria ao partido A (20%), distorcendo muito menos a vontade popular do que se fosse usado o sistema de maior sobra.

Nem sempre a melhor solução é a que primeiro salta aos olhos.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Paranóia de mercado

Outro dia ouvi no rádio uma propaganda que era algo assim "venha para o primeiro feirão de carros desse ano...de 2012!". Era o anúncio de uma feira de carros, em Maio de 2011, só com carrros de modelos do ano que vem. Pqp, estamos em Maio...lembro de alguns anos atrás, quando já era uma novidade você poder comprar em Dezembro os carros com modelo do novo ano. Parece que a competição de mercado foi antecipando isso de tal maneira que, daqui a pouco, estaremos comprando carro de modelos de 3 anos pra frente.

Isso me lembra uma situação que acontecia quando eu trabalhava em banco. No mercado de empréstimos para pessoas jurídicas, um momento importante é a tomada de empréstimo, pelas empresas, para pagar o décimo-terceiro salário. Quer dizer, a legislação trabalhista cria uma obrigação paras as empresas que não tem a menor correlação com a realidade econômica; quando chega o momento de pagar a primeira parcela, que geralmente é começo de Novembro, a maioria das empresas procura os bancos para tomar um empréstimo específico para isso. Os bancos movimentam-se, nessa época, para montar estruturas de divulgação, propaganda, movimentação de pessoal interno para ganhar a maior parte possível desse mercado. Há 10 anos, quando primeiro tomei contato com essa realidade, lembro dessa discussão dentro do banco começar no começo de Outubro, porque durante o mês de Outubro, Novembro e, às vezes, começo de Dezembro as empresas tomariam esse empréstimo. Por conta da disputa mercadológica entre os bancos, esse prazo foi diminuindo...lembro bem claramente que, um belo ano, estávamos em Maio e, numa reunião de equipe, o nosso chefe comentou 'e aí, o que vamos fazer pro décimo-terceiro esse ano?". A cara de todos, minha inclusive, foi de surpresa. Caraio, tamos em Maio! O nosso chefe falou "mas o Santander já está anunciando"...O que tinha acontecido é que, em uma reounião com o pessoal do comercial, o diretor comercial cobrou justamente isso: que o Santander já estava anunciando e o nosso banco não tinha nem começado a se coçar. Não importava que o momento da propaganda e da ação comercial estivesse totalmente descolado do momento em que, efetivamente, as empresas tomavam sua decisão nesse sentido.

Um tempo atrás lançaram aquele açúcar light. Parece que é uma mistura de açúcar com adoçante; não é nem açúcar, nem adoçante, é algo meio termo - tem cara de açúcar, gosto de algo mais ou menos e não é tão calórico. E tão anunciando como se fosse uma p* invenção. Isso me lembra algo, novamente, do mercado bancário: a primeira vez que lançaram o empréstimo que, se você pagar todas as parcelas no prazo, você não paga a última parcela. O mercado se alvoroçou; no banco que eu trabalhava, as pessoas eram cobradas "porque ainda não temos aquele produto maravilhoso que o banco x tem". Claro, qualquer ser pensante entende que o banco não é instituição de caridade e, se ele te oferece algo assim, alguma compensação tem. A lógica aqui é clara: a taxa de juros é mais alta o suficiente para compensar a eventual "perda" dessa última parcela. Há considerações de crédito que tornam o produto interessante, mas o importante é que o alvoroço era pelo suposto genial apelo comercial. O problema é que se um dia eu voltar a trabalhar em empresas, é uma coisa com a qual terei de me adaptar. Eu não vejo nada de errado em que o mercado funcione dessa maneira, e até entendo a lógica. Eu só não tenho saco; como diria Raul "macaco jornal tobogã eu acho tudo isso um saco". Se você pudesse ficar no seu cantinho e, quando ordenado, executar a maluquice qualquer da vez que os caras inventassem, beleza - mas não é assim que funciona. O cara que primeiro inventou e implantou esse produto de isenção da última parcela deve ter recebido um bônus animal e ficou bem visto; assim como o cara que inventou o açúcar light. Os outros eram os perdedores que não inventaram nada de interessante... Cria-se um ambiente de total loucura na busca dessas supostas vantagens, de estar na frente; se o diretor (ou apenas UM diretor, se esse diretor foi influente o suficiente para que ninguém se ache no direito de questioná-lo) pôs na cabeça que a oitava da maravilha será alcançar aquela vantagem específica, isso passa a ser mais urgente do que tirar o pai da forca. Claro, apenas até outro diretor por outra coisa na cabeça...

Do ponto de vista da macroeconomia, a teoria geral inicial do capitalismo era a máxima Smithiana de que se todos buscarem o melhor para o seu interesse próprio, a mão invisível do mercado encarregar-se-ia de garantir que isso implicasse no melhor para a sociedade como um todo. John Nash, com sua teoria dos jogos, provou que isso nem sempre é verdade: é bem possível agentes interagindo escolherem o que é mmelhor para si e o resultado geral ser longe do ideal para todos. O liberalismo clássico vem sendo modificado pelas claras evidências que alguma - nem tão pouca assim - regulação é necessária. Parece que dentro das empresas, e nas competições mercadológicas em geral, ainda estamos no principio antigo do capitalismo. Cada um buscando o melhor de si e, boa parte das vezes, não gerando a melhor situação possível para todos. E não falo de algo ideológico do "social" - falo para todos dentro da empresa ou do próprio mercado! - em termos de resultado, de eficiência, de alcançar melhores metas com menos esforços. É a paranóia...

sábado, 21 de maio de 2011

Realengo e desarmamento

Mais um da série "desenterrando posts não postados"; esse aí foi logo após aquela tragédia na escola carioca. Interessante que, pouco tempo depois, já estamos falando de outras coisas - o assunto já foi o casamento real, o casamento gay, o pallocci...

* * * * *


À época do plesbiscito sobre a proibição do uso de armas, votei a favor da proibição. Em muitos círculos sociais que frequentava, era voto vencido - a maioria esmagadora era contra. Hoje, dias após a tragédia do realengo, volta-se a falar com força sobre isso e, aparentemente, alguns setores que, antes, colocavam-se contra, põe-se agora a favor. O que eu penso? Bom, seria muito cômodo dizer algo como "pois é, era isso que eu pensava", mas como tudo no Brasil que gera um certo consenso costuma estar errado...No colégio, eu tinha um professor de história que fazia provas teste, apresentando duas sentenças, e as alternativas eram algum tipo de relação entre as frases, algo como "as duas afirmações estão corretas, mas a segunda não explica a primeira".

Então, nesse caso, acho que é isso: sou totalmente a favor do desarmamento, mas tomar isso como a grande solução para evitar esse tipo de caso que aconteceu no RJ é besteira. O furor com o que se discute, agora, esse assunto, só pode ser entendido como a necessidade de se ocupar de algo.

Por que sou a favor do desarmamento (do ponto de vista jurídico, ou seja, a proibição total do porte e uso de armas de fogo por civis)? Bom, são vários motivos. Na verdade, acho que a pergunta deve ser invertida: em uma democracia, o uso da força é exclusividade das forças de proteção do Estado. Existem motivos para permitir que civis portem armas? Acho que, de forma geral, esgotamos esse motivos. Por exemplo,o argumento do direito individual: uma irresponsabilidade de alguns não pode privar o direito de muitos. Mas direito vem unido com responsabilidade, com arcar com ônus e bônus. E quem arca com o ônus da arma? Não é o portador. Estatísticas mostram um alto percentual de acidentes com crianças (por pais que tem armas e não conseguiram esconder direito), de armas "legais" sendo roubadas e armando ainda mais a bandidagem etc. Uma outra estatística é a que mostra que a maioria dos homicídios é de proximidade: briga de trânsito, disputas familiares ou de vizinhos etc. Quem arca com esse custo social? Aí vem aquele argumento "ah, mas automóveis matam mais do que armas, vamos proibir também os automóveis?". Deveria ser óbvia a diferença, mas vá lá: o objetivo principal de um automóvel é locomoção - causar acidentes é um desvio. Qual é o objetivo principal de uma arma mesmo? Ai tem aquele outro arguemento, de que há áreas do país que o Estado não alcança e as pessoas precisam se proteger: quer dizer que, nessas áreas, o Estado não chega para trazer proteção, mas chegaria para punir alguém descumprindo a lei de desarmamento? Ora essa, se vamos ser ser coniventes com a própria falta de competência do Estado, não sejamos em termos de legislação - sejamos na prática, tendo leniência com a fiscalização e punição em especificidades regionais.

Isso tudo posto, continuo achando que uma coisa não tem muita relação com outra - um doente mental, com um plano trágico como esse maluco do RJ tinha, vai dar um jeito de arrumar uma arma. Alguém que "desistisse" do seu plano por uma dificuldade adicional de achar uma arma não estaria, nem de perto, no nível de desequilíbrio para tomar uma atitude dessas. Tampouco parece-me razoável discutir "segurança" nas escolas - primeiro porque não conseguimos nem bons professores de português e matemática, vamos conseguir um nível satisfatório de segurança? E depois, se as escolas estiverem bem protegidas, qual será o próximo passo? Hospitais, shoppings, igrejas? Alguém com esse intuito pode achar o lugar que bem entender para promover o terror - vide o caso do cinema em sp ou do maluco que bateu com o taco de baseball na cabeça do outro numa livraria. O desarmamento, além de conceitual - estabelecer na constituição que, não, o cidadão comum não tem direito a fazer uso desse tipo de força para "se defender" - tenderia a diminuir essa morte por proximidade. Em alguns momentos, a ocasião faz o ladrão - a briga, a discussão, a rixa, poderiam acabar de maneira menos trágica se o cabra não tivesse uma arma em casa; não fosse assim, não teríamos especificação, na legislação, de homicídio premeditado. Mas o mundo moderno, infelizmente, terá de conviver, de tempos em tempos, com eventos como esse do RJ.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Top Chef

Aproveitando a fase de baixa produção bloguística, vou entrar no embalo do texto da Deise sobre o Seriado Top Chef e postar um texto que eu tinha escrito sobre um episódio desde mesmo seriado, mas nunca tinha postado.

* * *

Já escrevi textos aqui inspirados em algum episódio dos seriados que costumo assistir. Dessa vez, o seriado é Top Chef, uma espécie de reality show com chefs de cozinha. Gosto do seriado porque alia coisas de legal de cozinha - os desafios são sempre preparar algum tipo de prato, um menu, uma sobremesa - com os conflitos entre as pessoas característicos de um reality. Pena que não assisto mais porque, além de nem saber o dia e horário que passa, não consegui achar para baixar na internet. Esse episódio que inspirou o texto eu peguei de orelhada - não estava acompanhando a temporada episódio a episódio.

Enfim, ao episódio: é uma etapa das mais conhecidas para quem acompanha o programa, chamada de "restaurant war" - os chefs são divididos em quatro grupos, e cada grupo tem 1 dia para montar um restaurante com menu próprio. Eles tem de pensar num menu simplificado (duas entradas, dois pratos principais etc), uma hora para comprar os ingredientes, três horas para pré-preparar os pratos quando, no final, um grupo de pessoas e os jurados comerão nos 2 restaurantes e farão julgamentos. Como disse, não estava acompanhando a temporada, então minhas impressões são apenas desse episódio. Um dos grupos parecia mais unido, e já tinha ganhado o desafio anterior; as decisões eram tomadas em comum acordo dos participantes, de maneira mais harmoniosa - tudo parecia fluir mais tranquilamente. Já o segundo grupo parecia mais segregado, mas tinha um chef que (pelo que entendi, os jurados consideravam esse jurado um dos melhores participantes) meio que mandava no grupo: discutia todas as sugestões, barrava as que não pareciam fazer muito sentido, tentava coordenar o grupo - claro, à custa da cara feia dos outros chefs e, durante as etapas da competição, até algumas rusgas.
Bom, acontece que o segundo grupo, do chef brigão, ganhou o desafio. Ganhou não, deu um baile, a ponto dos jurados comentarem que o desempenho deles tinha sido o melhor das seis temporadas do programa, enquanto o outro grupo foi criticado em quase todas as decisões - menu, execução de prato, atendimento no salão etc.
A tarefa que os participantes tinham que desempenhar era de extrema pressão, e exigia, entre outras coisas, capacidade de decisões acertadas em curtíssimo prazo (coisa que, parece-me, é bem característica da atividade de Chef). Capacidade de raciocínio rápido, bom senso e eficiência não são habilidades comuns na maioria das pessoas - é para isso que existem líderes, alguém que (supostamente) tenha a capacidade de direcionar o grupo para ações de maior eficiência. Guardadas as devidas proporções, há certas situações que o "bom mocismo", a gentileza, a preocupação excessiva com o sentimento dos outros não se coadunam com o bom resultado prático: o grande cirurgião na emergência não vai pedir ao médico iniciante "por gentileza, você pode fazer esse corte aqui, porque sabe, aqui passa a artéria xpto..."; grandes generais da história, que ganharam grandes batalhas, não deviam discutir minuciosamente seus planos de guerra com muitos subordinados; técnicos de sucesso, como Telê, Felipão, Luxa, Muricy, Mourinho, não são amiguinhos dos jogadores nem pedem "por favor, v. sa. deve acompanhar o volante do outro time até o final, viu...".
Não se trata de pregar a falta de tato com as pessoas, é apenas que, às vezes, não dá para se preocupar tanto com isso. No caso dos chefs, o cara pode ter ferido sentimentos, mas levou o grupo a uma grande vitória e todos se safaram da eliminação. Em empresas, isso acontece também: é comum os "chefes" terem como característica algo que flutue entre "o chefe gente boa mas que não te consegue um aumento", justamente porque os resultados são fracos, e o "chefe meio casca grossa mas que consegue tudo que quer", porque ele dá muito resultado e, consequentemente, tem moral com o povo de cima. Claro, existem pessoas - e eu mesmo já tive chefes assim - que aliam um pouco das duas características, mas é incomum.
Cafuné não enche barriga, e afinal para isso que a gente tem mãe, esposa, namorada...no trabalho, as vezes é mais importante produtividade, eficiência, nem que isso custe um pouco de delicadeza. Não sei se isso é característico do brasileiro, mas sinto que a gente tem a tendência de hipervalorizar o "bonzinho" inepto que, no final das contas, produz muito pouco.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Satisfação

só dando uma satisfação aos eventais gatos-pingados leitores do blog ehehe: esses dias decidi me dedicar a um novo projeto que tem tomado bastante tempo; imagino que daqui a algum tempo eu me adapte melhor às novas atividades e volte a postar aqui de vez em quando!

sábado, 16 de abril de 2011

As 7 melhores séries de TV da História

Há uma frase muito refinada e de sabedoria profunda que diz: "opinião é que nem bunda: todo mundo tem a sua"...pois é, a lista reflete apenas a minha opinião das séries que já assisti. Ainda sim faz-se necessário alguns esclarecimentos. Por ex, não me lembro de ter visto uma febre tão estrondosa quanto Lost - na época, conheci muita gente literalmente viciada. Mas eu nunca vi um episódio de Lost, então não dá para estar na lista, assim como a maioria das séries que existe, porque não as vi. Em quase toda lista de melhores seriados que já se fez em revistas ou jornais americanos, Simpsons sempre aparece em primeiro ou, pelo menos, nos primeiros lugares - do ponto de vista de conteúdo, também apareceria na minha, mas é mais um desenho do que um seriado. Não teve o desafio de escolher atores e estar exposta à atuação (brilhante ou medíocre) que esses atores teriam por cada papel - então também excluí da lista. Um exemplo característico dos critérios da lista é a série "two and a half men" - dificilmente consigo achar um episódio desse seriado ruim. Mas é uma série mais recente, os temas, embora sempre bem explorados, são meio repetitivos - dei importância a uma certa universalidade. Bom, chega de enrolation, em cada seriado eu também tento me lembrar de algum episódio que me marcou muito.

7 - Seinfield
Quem nunca viu esse seriado, se pegar aleatoriamente um episódio para assistir provavelmente achará um tanto sem graça - mudou muito a dinâmica desse tipo de seriado. Mas além de Jerry Seinfield ter sido o precursor de um determinado tipo de humor na televisão americana, conseguiu fazê-lo com muita simplicidade, com temas do cotidiano, com a dinâmica dos personagens que, afinal, eram pessoas muito parecidas com qualquer um que a gente conheça. Quando se conhece um pouco dos personagens, qualquer episódio de Seinfield torna-se engraçadíssimo...lembro-me de um em que o personagem George Constanza está tendo problemas para sair com mulheres, e aí o pessoal acaba tentando ajudá-lo, dando confiança para falar com mulheres nos lugares - é bem engraçado!

6- House
O que começou como um trama apenas em volta de um médico prepotente amalucado conseguiu-se firmar como um seriado de altíssima qualidade, em vários aspectos. Claro, o personagem de Hugh Laurie - e a sua atuação - é 60% da coisa, mas não é só isso; há as discussões médicas, que para quem gosta - e para leigos como eu - parecem bem embasadas; há toda uma discussão, por conta da história dos pacientes ou dos próprios médicos que compõe a equipe de House a cada momento, sobre as verdadeiras razões do comportamento humano. E House pode ser um verdadeiro soco no estômago com suas opiniões e posicionamentos - egoístas, arrogantes, mas nem por isso menos verdadeiros...vários episódios são fantásticos, mas ressalto 2: o episódio onde descobrimos daonde vem o problema da perna dele, e o episódio onde um paciente entra na sala de diagnósticos e dá um tiro no House (claro, ele não morre...).

5- Boston Legal
No Brasil não é dos seriados mais conhecidos - eu mesmo conheci recentemente por indicação de uma pessoa próxima. Mas logo que conheci devorei as 3 primeiras temporadas rapidamente. É o dia a dia de um escritório de advogados em - óbvio - Boston; os julgamentos e as questões jurídicas são pano de fundo para discussão de grandes problemas americanos - as guerras, republicanos x democratas, direitos de expressão, tolerância religiosa etc - e os dramas pessoais dos personagens. Tudo permeado com humor - que as vezes chega a ser pastelão, mas uma vez que você se habitua, passa a ser bem engraçado. Os episódios de final de temporada costumam ser em outras cidades, e são sempre muito bons; fora disso, tem um que Alan Shore e Denny Crane vão pescar que é simplesmente hilário!

4 - Married with Children
Bom, quem não conhece Al Bundy está perdendo a sabedoria de uns dos grandes sábios desse mundo eheheh...para os mais modernos, é o mesmo ator de Modern Family, casado com a cubana. Certamente esse tipo de humor e sátira ao american way of life inspirou depois os Simpsons - produzido pela mesma Fox; essa série de tv talvez tenha sido a primeira a adotar esse tipo de humor ácido e crítico a sociedade americana. Isso tudo a parte, o seriado é muito engraçado! Os atores caíram muito bem nos seus personagens, desde os fillhos do casal Kelly e Bud e até os vizinhos! Bom, faz quase 25 anos que a série foi lançada, então todo o cenário, as imagens, as roupas, está tudo muito diferente de hoje; ainda sim vale muito a pena. São muitos episódios muito bons e não lembro de quase nenhum inteiro, mas aquele que o Bud tem um clube de amigos que são apertadores de seios é de rolar no chão de tanto rir (para homens em especial, mulheres certamente acharão uma bobajada sem fim!)

3- 24 horas
Ok, Jack Bauer é uma mistura de Mcgyver com Capitão Nascimento, e o tema, no final das contas, é aquele ideal republicano - uma guerra americana contra o terrorismo que se utiliza de métodos nada ortodoxos (o fato do seriado ser produzido pela Fox já é algum indicativo...). Mas ainda sim, é do car*!! A proposta totalmente inovadora de fazer um seriado em "tempo real" (cada episódio da temporada de 24 episódios é uma hora em um dia) dá muito certo e não enjôa; também houve inovações nas câmeras, nos enquadramentos (como naquelas montagens onde você vê quatro cenas ao mesmo tempo). Poderia ficar repetitivo e sem graça, mas não fica - os temas se renovam, e quase nunca as coisas dão certo - as pessoas morrem, os terorristas tem sucesso em algumas ações, os bonzinhos nem sempre são bonzinhos e assim por diante - de modo que você não sabe o que esperar, mesmo. Não se discute nada, é a ação pela ação - ainda sim, é muito bom. É difícil apontar um episódio porque cada um é diretamente conectado a história na qual está encaixado, mas o último episódio da primeira temporada é marcante - talvez porque lá você tome a primeira grande porrada e pense "bom, então esse seriado é assim mesmo?" eheheh

2 - Anos incríveis
Esse, então, é indiscritível de bom, para quem gosta de drama. Os caras conseguiram, com uma sensibilidade sem fim, transformar a supostamente ingênua vida de um pré-adolescente no cenário ideal para discussão dos maiores dramas da nossa vida: relacioamento amoroso, familiar, com amigos, medo de rejeição, desejo de agradar etc etc etc. Sem apelar, com recursos simples, ótimas atuações, questões muito complexas são tratadas de forma magistral. É um p* seriado, daqueles que dificilmente consegue se repetir. O episódio que o Kevin vai no escritório do pai deve fazer muito adulto pensar muito - embora eu tenha assistido enquanto ainda estava no colégio...

1- Friends
Não dava para não ser o primeiro da lista..Podia perder para algum outro em algum aspecto específico, mas na soma ganhava de longe! São 10 temporadas de um seriado muito bom, em alto nível (embora as últimas temporadas já estivessem um pouco sem graça), com ótimos roteiros, ótimos personagens, atores que se encaixaram perfeitamente nos seus papéis. É de longe a série que mais assisti - há episódios que sei as falas de cor. E marcou uma época também, uma geração, um certo estilo de ser - embora fosse uma série de comédia, os conflitos que eles viviam podiam ser vividos por qualquer um. Quem não conhece, alugue ou baixe a primeira temporada, mas já aviso - arrume tempo para assistir, aos poucos, todas as outras, pois você vai viciar. Difícil escolher episódios, mas lembro de ter caído no chão de rir da primeira vez que assisti o episódio onde o Joey assume a culpa por uma série de coisas que acontecem para ninguém saber que a Monica e o Chandler estão dormindo juntos.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

De quem é o dinheiro público?

Tem uma frase, que já ouvi há muito tempo e mais de uma vez, que diz mais ou menos assim: "Nos países desenvolvidos, o que é público é de todo mundo; nos subdesenvolvidos, o que é público não é de ninguém". Isso se traduz em uma atitude com as coisas públicas: se é de todo mundo, também é meu, então eu cuido, vigio, uso com responsabilidade, assim como faço com todas as outras coisas que são minhas; se não é de ninguém, eu não estou nem aí, e se for usar, uso sem cuidado, sem preocupação, como um saqueamento em uma região abandonada ou num caminhão caído à beira da estrada...

Em que tipo de pensamento geral em relação à coisa pública nos encaixamos no Brasil é desnecessário dizer. Mas isso tem uma repercussão ainda mais trágica quando se trata do dinheiro público. Acho que há uma sensação geral de que aquele dinheiro não é de ninguém, ou é do Estado, governo, como se essas instituições fossem algo que existissem por si mesmas. Por ex, quando nos indignamos com o salário dos deputados, minha sensação é de que existe mais um pensamento na linha de "p*, o cara ganha tudo isso enquanto eu ganho muito menos?" do que algo do tipo "p*, esse dinheiro tá saindo do meu bolso!!".

E uma coisa que, se não é causa, ajuda a manter esse comportamento, é a falta de percepção clara do quanto o imposto pago é dinheiro a menos na sua vida, dinheiro retirado pelo governo do seu bolso que poderia estar sendo usado por você para uma condição melhor de vida. Há pequenas situações onde essa indignação aparece: quem tem carro e paga ipva costuma ficar p* de pagar esse imposto e ver que pouca coisa é feita para melhoria das vias públicas; quem tem apto e paga iptu também sente coisa parecida. Mas é um sentimento nem tão intenso e que atinge apenas uma parcela da população. Uma coisa que poderia ser mais forte para estimular essa sensação é o imposto de renda. Mas pensa só: a população economica ativa brasileira é de 50%. Desse universo, há 10% de desemprego e apenas 50% dos empregados tem emprego formal - que pagam imposto. Dos que ganham salário formal, apenas os que ganhem, digamos, acima de 3 mil, sente efetivamente um volume de dinheiro sendo retirado de si (a isenção do IR vai até 1,5 mil, e alguém que ganha 2,5 mil, por ex, paga menos de 4% de IR sobre a sua renda, pouco para sentir alguma diferença...) - se considerarmos as diversas regiões do Brasil, e vários setores de trabalho, como chão de fábrica, serviço, saúdes, é até conservador estabelecermos que só 50% ganham acima de 3 mil (meu palpite é que é bem menos de 50%). Tudo calculado, pouco mais de 10% da população brasileira conseguem sentir diretamente o efeito do imposto de renda sendo subtraído mensalmente das suas receitas! O maior efeito do imposto na nossas vidas é o preço dos vários itens que consumimos que estão sempre majorados pela carga de impostos que foram incidindo ao longo da cadeia produtiva.

Uma coisa que poderia ajudar é se tívessemos alguma metodologia semelhante aos Estados Unidos: a cada coisa que você compra, você sabe claramente o quanto é o valor do produto e o quanto é o imposto. Em média, pagamos 40% de imposto; imagine que na sua passagem de ônibus, você estivesse sendo sempre lembrado de que dos 3 reais, 1,20 é imposto? Do pf de 8 reais na padoca, 3,20 é imposto? Do aluguel de 1000 reais, 400 reais é imposto? (no caso do aluguel, o imposto não é direto porque provavelmente o valor é cobrado por um particular; mas se entendermos que o custo total da economia está majorado em 40% por causa dos impostos, é de se imaginar que o dono do imóvel poderia cobrar 40% a menos). Acho que a lembrança diária de quanto dinheiro poderia sobrar para você caso os impostos fossem menores seria muito benéfica para que todos sentissem, quando o noticiário da tv anunciasse "deflagrada operação da PF contra corruptos que desviaram x milhões" todo mundo se indignasse e pensasse "FDPs!! tudo na minha vida é bem mais caro para esse bando de fdp me roubar desse jeito???"

O Brasil é um dos países do mundo com a relação custo x benefício para o contribuinte mais injusta. A Suécia tem o nível de tributação parecido com o nosso, mas o sistema educacional, de saúde e de suporte social é infinitamente melhor. A China tem sistemas de educação e saúde públicos piores do que os nossos, em geral, mas pelo menos o cidadão paga menos de 20% de imposto. O Brasil consegue aliar a alta carga tributária Sueca a um padrão chinês de baixa qualidade de serviços. E a gente tá cag* e andando para isso...toda vez que escuto coisas do tipo "governo pensa em criar estatal para cuidar do trem bala" eu só consigo pensar que devemos estar muito anestesiados, pois a indignação geral é um décimo do que deveria ser.

quarta-feira, 30 de março de 2011

Planejamento financeiro

Eu não costumo ler colunas de jornal ou prestar atenção em participações especiais em rádio ou tv desses consultores financeiros; geralmente eles não falam nada que a gente já não saiba, ou pior, inventam alguma coisa totalmente sem sentido ou sem utilidade prática. Por força das circunstâncias, assisti uma pequena palestra dum famoso consultor chamado Gustavo Cerbasi, e acabei lendo um livro dele. Foi a primeira vez, que eu me lembre, de algum consultor ter falado algo diferente e que fizesse, para mim, muito sentido.

Não, ele não nega a premissa de que é preciso guardar dinheiro - e, para isso, é preciso gastar menos do que se ganha. Mas uma coisa que me chamou a atenção foi a maneira que ele propõe de organização de gastos que, além de diferente do que costumeiramente consultores financeiros propõe, era algo que eu fazia instintivamente. Primeiro, para começar, é preciso estabelecer o quanto se quer guardar por mês. Até aí, nenhuma novidade, inclusive na dificuldade de colocar em prática - a gente costuma ver quanto "sobra" no final do mês, e não determinar que se quer guardar x% do que ganha...mas vá lá: assim como outros consultores, ele propõe que, quem tenha dificuldade de disciplinar-se a guardar aquele valor, assuma um compromisso mensal - como a prestação de um apartamento ou de um consórcio de alguma coisa - de modo que, assim que o dinheiro caiu na conta, aquela parcela já saia automaticamente.

E aí vem a inversão interessante. O mais comum de fazermos é "começarmos" a estabelecer os nossos gastos por aqueles chamados gastos "fixos", estruturais - casa, carro etc. Tomamos esses gastos meio como dados - "ah, gasto x com o apartamento, mais y com o carro..." - e, o que sobra, fica para as coisas do lazer. Ele propõe a inversão da ordem dos gastos - que, depois de se ter "guardado" o percentual determinado, estabeleça-se o quanto vai se gastar (mais ou menos) com seu lazer primeiro - saídas, compras etc, e aí acomode-se os gastos fixos com o que sobrar. Antes de analisar isso mais a fundo, eu entendo que há importantes motivos para essa inversão.

O primeiro é quantitativo: gastos com estrutura geralmente são muito mais significativos - de modo que alterações desse tipo de gasto apresentam mais diferença. Por ex, há uma conta de que a gente gaste, em média, 2% do valor do carro por mês (em seguro, ipva, depreciação, custo do dinheiro que poderia estar investido, manutenção, as vezes garagem adicional, sem contar gasolina, apenas gastos ligados ao simples fato de ter o carro). Então, se você tem um carro de 40 mil reais, em média você gasta 800 reais por mês com ele. Os gastos para morar dessa pessoa, então, devem ser bem maiores do que isso...O tamanho da diferença que um alto ou um baixo gasto nesses aspectos pode produzir é grande se comparado a gastos de lazer (sem exageros), onde a diferença de alguma alteração pode não ser tão significativa. O segundo aspecto importante é a sustentabilidade de certos cortes de gasto. Tem aquele exemplo conhecido do cafézinho: se você deixar de tomar aquele café da tarde, que custa 2 reais, em dez anos você terá economizado 8 mil reais. Ok, mas quanto isso te custou em qualidade de vida, se esse é o momento que, toda tarde, você sai para descontrair um pouco, conversar com os amigos? Será que isso não afetará até a sua produtividade, podendo te prejudicar muito mais financeiramente? Embora sempre haja espaço para cortar gastos eventuais com lazer, há sempre o limite da sustentabilidade: será que aquele nível de consumo tão baixo é sustentável a longo prazo, sem te enlouquecer? Porque o que acontece é que pensamos "ah, mas se eu só gastar X com lazer, vai sobrar alguma coisa para guardar"; só que aí você compra uma roupa que viu, alguém te chamou para ir em algum lugar mais caro, faz 3 anos que você não sai de férias e...bum! lá se foi o que você ia guardar...O que nos leva a um terceiro motivo: uma mudança de padrão em um custo fixo (para cima ou para baixo) é uma mudança para todos os meses - aquele dinheiro sobra ou falta todo mês. Um corte em um gasto de lazer (por ex, não sair naquele final de semana) produziu um efeito específico naquele mês, mas para o efeito ser repetido, no próximo mês você deverá fazer o mesmo sacrificio.

Claro que não tem mágica; ele não sugere, então, que não haja controle ou parcimônia nos gastos com lazer, sem o que não há planejamento financeiro possível. Outra coisa óbvia mas que não custa falar é que esse tipo de lógica se aplica às pessoas cuja situação financeira permite algum tipo de arranjo - o trabalhador que ganha salário mínimo e mal consegue por comida na mesa é outra história. Mas ainda sim gostei da lógica que ele propõe que, como falei, pareceu-me bem destoante daquele coro velho e batido dos consultores financeiros...

sábado, 26 de março de 2011

BBB - texto do Rica Perrone

Há algum tempo eu queria escrever algo sobre o BBB; até esbocei, mas não foi muito longe. Agora o Rica Perrone escreveu um que, bem, era bem o que eu queria dizer ehehhe...apenas um adendo quanto aos "metidos a intelectuais": eu conheço pessoas que não perdem tempo com bbb porque, realmente, interessam-se por coisas com mais conteúdo. Mas na maioria das vezes as pessoas com o discurso que ele cita no texto realmente perdem tempo com coisas até piores...bom, segue lá:

O BBB que eu queria
Como a maioria, vejo o BBB sempre que possível. E gosto. Não, não farei o tipo de dizer que “é um lixo” pra assistir escondido.

Dizem os metidos a intelectuais que é um programa “sem conteúdo”. Eu nem acho tanto assim. Mas concordaria, porém, se alguém me falasse que é um programa repetitivo.

Toda edição a gente vai ver os 14 pra saber se tem conhecido. Não tendo, assistimos de vez em quando e ficamos sabendo o que rola pelas chamadas da Globo e capas de todos os portais web do país.

No primeiro dia eles cantam, pulam, se juram amigos e fazem promessas coletivas de “vamos fazer o melhor BBB! UHUUUUUUUU!”. Sempre tem um pra gritar: “Sem briga, galera! Na paz! Temos que dar exemplo pro Brasil!”.

Todos os demais, imediatamente, seguindo a mania pouco normal da juventude atual, gritam: “Uhuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu!!!!!!!!!!!!!”, que traduzindo quer dizer: “Uhuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu!!!!!!!!”.

Em casa eu penso: “Quando será que vai aparecer um cara pra dizer, no primeiro dia da casa “Ae galera! Vamo fecha o tempo nessa porra porque quem tá em casa quer ver o circo pegar fogo! UHUUUUUUUUU!”?

Todos sentam na mesa e vem aquele jogo de perguntas e respostas pra se conhecer melhor. É sensacional!

“Eu odeio falsidade”, diz a primeira.

“Quer me ver puta? Gente falsa. Ahh… eu não suporto!”, diz outro.

“Eu odeio fofoca. Acho que quer falar? Fala na cara, sabe…”, diz outra topeira.

E eu, sonhando em casa com um que vai colar dizendo: “Porra, me amarro em falsidade. Não falo na cara, faço joguinho e acho que vocês estão confundindo isso com o Parque da Monica”.

Seria meu ídolo.

Começam as sondagens pra saber a situação amorosa de cada um.

A gostosa diz: “Tô solteiríssima!” E a turma: “Aeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeee!!!!!”

A feinha diz: “Eu to livre”. E um, normalmente viado, grita: “Uhuuuuuuuuuuu!”, sem companhia.

Até que passam os dias, eles vão se conhecendo e achando que são melhores amigos ha 10 anos.

O primeiro chora, e logo surge alguém que nunca viu o cara na frente pra dizer: “Cara, você é guerreira! Sabe quantos queriam estar aqui? Tipo, você já é uma vencedora!”.

Hã?

Vem o paredão e o confessionário me faz mudar de canal. São 14 caras que entram lá pra dizer: “Porra, adoro essa pessoa, mas é por afinidade, sabe? Já que tem que votar, vai no XXXXXX. Mas ó! Adoro ela!!!!”.

Vou sair comemorando nu na varanda quando alguém disser: “Eu voto no Ciclano porque acho ele um cu!”

Ah que beleza seria. Mas não será.

Eu me divirto. Não exatamente com o que eles falam, mas pensando no que eu gostaria que eles falassem.

Quando um emparedado fica, ao invés de gritar “Obrigado Brasiiiiiiiiiiiiil!” no jardim, espero sempre que ele vá até a porta e grite: ‘Chuuuuuuuuuuuuuuupa Ciclano!” pro que saiu.

Mas eles são muito previsíveis.

abs,
RicaPerrone

quinta-feira, 24 de março de 2011

Sobre ganhos e gastos

Uma vez, em uma conversa com meu irmão e com meu pai, não sei porque o assunto estava em planejamento financeiro, e em algum momento eu falei "pois é, porque sempre se deve ganhar mais do que se gasta...". E eles me olharam com uma cara esquisita, e um deles respondeu "não né, é o contrário, gastar menos do que se ganha", no qual o outro, no mesmo momento, concordou. Claro, a curto prazo, em qualquer planejamento financeiro tem-se muito mais controle sobre o quanto se gasta do que quanto se ganha; a variável "ganhos" é incontrolável: você tem o seu salário, ou o quanto a sua empresa consegue faturar, ou quantos clientes você tem etc - embora você sempre esteja fazendo esforço para aumentar a sua renda, os resultados serão sempre indiretos e a longo prazo. Agora, sobre os seus gastos você pode atuar da maneira que bem entender.
Mas não foi bem aquilo que eu quis dizer - talvez não tivesse a ver com a conversa do momento, mas era uma idéia que estava na minha cabeça. Tratando-se de filosofia de vida - e não de planejamento financeiro puro e simples - acho que a gente não lida com essa questão de ganho x gasto de uma maneira adequada. A maneira mais comum de se lidar com essa questão é como se a variável "ganhos" fosse a variável indepedente (a qual você não controla, cujo resultado será sempre um dado para você) e a variável "gastos" fosse a dependente, ou seja, a que deverá ser ajustada conforme a primeira variável. Dependendo de quanto eu ganho, eu decido quanto gastar. Faz muito sentido - e aliás, quem não faz isso, deve estar com sérios problemas financeiros! - mas acho que isso gera um problema, embora óbvio, pouco visível.

Acho que meus avôs tinham muito medo de passar fome; de a situação econômica deles se deteriorar a tal ponto de não ter comida para por na mesa. Não era um medo particular deles, era o medo de toda uma geração de um país onde muito poucos eram "doutores" e a imensa maioria era uma grande classe média baixa. 40 anos de crescimento econômico depois, existem muitas diferenças no horizonte econômico que a minha geração está inserida. (Claro que, num país como o Brasil, altamente desigual, existem diferenças de horizontes gritantes de acordo com a classe social - aqui estou me referindo à classe social na qual eu e a maioria dos meus amigos está inserida). O risco de "passar fome" é muito menor do que era no passado; há uma classe média pujante no Brasil. Pessoas com uma boa formação, em faculdades de primeira linha, falando uma ou duas línguas estrangeiras, com alguma experiência em uma ou duas funções, e com disponibilidade de trabalhar, dificilmente vão passar fome. Há crises econômicas, há desemprego para trabalhadores de mais idade, sim, há isso tudo; o que estou querendo dizer é que o risco que esse grupo de pessoas está exposto não é o de total aniquilamento econômico - passar fome, ir morar embaixo da ponte. É o risco do fracasso; é o risco de não ser bem-sucedido, de ganhar pouco e contar os centavos no final do mês, de ter dificuldade de pagar o colégio dos filhos, de não fazer viagens de férias legais, de ficar 10 anos sem poder trocar de carro. Quando alguém dessa classe se mata para se qualificar melhor para o futuro, lambe o saco do chefe para ficar bem na foto e toma outras atitudes para "preservar a carreira", é nisso que está pensando. Esse medo pode vir até camuflado do medo de perder o emprego e nunca mais arrumar outro, mas no fundo esse não é um medo realista - já o medo de demorar 2 anos para arrumar algo e ter que aceitar um emprego ganhando metade do que ganha hoje, sim. Uma brincadeira entre minha irmã e eu é que "se tudo der errado, eu presto concurso público" - e no final, essa é uma saída mesmo - para quem uma boa formação e sempre esteve acostumado a estudar é mais fácil.

Isso tudo para dizer que, para a maioria das pessoas que eu convivo, a busca de melhoria financeira é muito menos uma necessidade primária e mais a busca de mais conforto - não, por isso, menos válido. E aí, voltando para o começo da conversa, o gasto vai sempre acompanhando o aumento gradual do ganho. Quantas vezes você não já viu - ou viveu - aquela situação: a pessoa tem aumento de salário, nos primeiros 2 meses é uma beleza, mas no terceiro mês já aumentou seu gastos proporcionalmente e continua não sobrando nada no final do mês? Meu gasto está totalmente balizado pelo meu ganho - para cima, que é absolutamente compreensível, mas também para baixo: porque gastar menos se eu posso gastar mais? Se ganhar dinheiro segue a lógica do "quanto mais melhor", e o gasto vai sempre acompanhando a renda, então "quanto mais ganho, mais gasto". Um raciocínio que eu mesmo já usei muitas vezes é aquele do "ah, é para isso que eu trabalho tanto" para justificar um consumo (uma roupa, um restaurante mais caro) fora do meu nível de consumo habitual. O ser-humano se habitua a qualquer coisa, mas se habitua mais rapidamente ao que é confortável - rapidamente você já está habituado aquele nível de conforto que o seu nível de renda atual consegue proporcionar.

Agora, o quadro está completo: o sujeito começou a sua vida profissional da maneira que todo mundo começa - por exemplo, arrumou um estágio enquanto fazia a faculdade. Foi indo, em algum momento foi efetivado, ficou feliz com seu salário aumentado. Mudou de empresa, foi promovido, gradualmente sua renda foi melhorando e, naturalmente, o nível de consumo acompanhou a melhora da renda. No começo alguns aumentos de gastos tinham aquela lógica do "é para isso que eu trabalho", depois foi se acostumando com aquele padrão de consumo.Só conseguia aguentar a volta para casa depois de 10h de trabalho porque seu carro era novo e confortável. Vestir aquele terno legal e sentir-se bonito / importante compensava um pouco o mal-estar. Jantar em um bom restaurante tomando um bom vinho trazia uma alegria que dava ânimo para continuar. Em suma, o padrão de consumo passou a ser o que fazia o sujeito suportar o desgaste do trabalho. Só que, ao passar do tempo, o que era consequência passa a ser causa: trabalha-se para manter aquele padrão. Quando o sujeito sente-se cansado e cogita a idéia de tentar uma mudança, todo aquele padrão cristalizou-se e ele acredita, piamente, que precisa daquilo tudo para viver. O que iniciou-se como uma recompensa passa a ser premissa.

Eu sei que é utópico, extramamente hipotético. Mas a dinâmica renda x outros fatores poderia ser sim uma via de influência recíproca. Todo mundo quer ganhar mais; mas se meus gastos estão estabelecidos pelo que faz sentido para mim - e não pelo "quanto mais melhor", fica mais fácil dosar melhor o quanto de esforço e sacrifício está sendo feito por aquele dinheiro.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Bush x Obama?

Por ocasião da visita do Obama ao Brasil - toda a pompa, entusiasmo da pessoas etc - e, em comparação à visita de Bush tempos atrás - onde o que mais se via eram manifestações de repulsa - vem uma pergunta: porque nós, brasileiros, de forma geral, gostamos tanto do Obama e odiamos tanto o Bush?

Eu, particularmente, gosto do simbolismo que a eleição do Obama carrega: é significativo que os EUA tenham eleito o primeiro presidente negro de sua história - com um bônus do fato dele ter ascendência arábe. Além disso, Obama é 3x mais carismático que Bush; tem aquele magnetismo pessoal e a capacidade de encantar platéias que figuras como o Lula têm - embora o americano tenha muito mais preparo e formação intelectual do que o brasileiro, pois se fosse diferente os EUA nunca o teriam eleito. Também não tenho nenhuma simpatia por Bush e, ademais, na minha ignorância de quem conhece as coisas por um elemento aqui e outro ali, acho que fez um governo apenas mediano. Diferenças essa a parte, do ponto de vista de uma nação estrangeira avaliando um governante de outro país, cabe fazer análises objetivas.

Há uma tendência de aproximação, em termos de política externa e comercial, entre Brasil e EUA - mas me parece que essa aproximação deve-se muito mais a uma sinalização da presidente Dilma de alterar o eixo da política externa brasileira do que de uma "boa vontade" do governo americano. No aspecto de política comercial, nada mudou e, provavelmente, nada mudará - Obama, mesmo que quisesse, teria pouca força para mudar as regras de subsídios que tantam atrapalham nossas exportações para lá. Bush era odiado mundialmente, em especial, pela invasão do Iraque. Obama ainda não teve a oportunidade de lidar com uma situação externa tão complexa quanto a que se seguiu após 11 de Setembro; nas ocasiões que apareceram nos dois últimos anos, o que vimos foi uma atuação um tanto atrapalhada: Honduras, Wiikleaks, Egito e, agora, Líbia. Esse desconforto parece vir do fato de Obama ter que sambar com dois ritmos ao mesmo tempo: a obrigação de "ser diferente", onde toda a sua campanha foi embasada, e a realização de que a função de presidente da nação mais poderosa do mundo traz complexidades acima do que pode-se imaginar. Por exemplo: fechar Guantánamo era uma plataforma de campanha que teve de ser, na melhor das hipóteses, postergada, pela complexidade (ou pela falta) da solução.

A realização de que Obama pode ser uma casca mais bonita do que eficaz pode estar acontecendo ao povo americano - vide o resultado das últimas eleições, onde os democratas tomaram um verdadeiro cacete. Bom, mas ele não fez nada de bom? Tem a aprovação do sistema de saúde, que do ponto de vista humanitário e de uma sociedade menos cruel, faz todo o sentido - mesmo que contrarie aspectos muito profundos da filosofia de vida americana. Mas não deixa de ser curioso que um povo como o brasileiro, que elegeu para mais quatro anos um grupo político que, nos últimos anos, tratou a saúde pública com verdadeira incompetência, aprecie um governante estrangeiro pelos seus avanços no campo da saúde.

Sendo assim, porque Bush era o diabo e Obama parece ser algo próximo de Deus? Não são, ambos, expressão de uma série de aspirações do mesmo povo americano, em um dado momento? A resposta que me parece mais clara é o fato de que, política, em especial no Brasil, é um exercício mais de paixão e de adoção de tendências da moda do que efetivamente um exercício da razão. No Brasil, é legal ser de esquerda, torcer pelo "socialmente justo" - seja lá o que isso queira dizer. Liberal, hoje, é o que era comunista nos anos 50 - come criancinha, filho do capeta etc. O engraçado é que liberal, nos EUA, é justamente o que muita gente aqui acha bacana - a antítese do conservador, mais identificado com os democratas. Os termos não tem mais sentido em si, adotam o sentido que cada um quiser em cada contexto. Obama é negro, jovem, tem uma linguagem fácil, é carismático - todas características que lhe conquistam votos de confiança e o permitem, ao contrário de Bush, começar o jogo contando com a boa vontade da opinião pública. Mas exercer a função que exerce exige muito, mais muito mais do que isso. Os que temiam que ele não estivesse preparado para o cargo podem estar tendo a confirmação dos seus medos. A averiguar.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Godfather

Cena do filme "O Poderoso Chefão" (The Godfather). As cinco famílias da máfia de Nova York estão em guerra. Tudo começou após um atentado à vida de Vito Corleone (Don Corleone), como tentativa de fazer que seu filho Sonny, próximo na escala hierárquica, aceitasse uma proposta de negócios. Enquanto Vito ainda estava no hospital, seus filhos entenderam que a única maneira de proteger a vida do seu pai era matar esse chefe do crime que estava por trás da tentativa de assassinato. Michael, o filho mais novo, encarregou-se da tarefa e, por também ter tido que matar um capitão da polícia que atuava como guarda-costas desse chefe do crime, teve de fugir e se refugiar na Itália. Muitas coisas aconteceram e, quando Vito conseguiu retomar o controle da família, decidiu que sua prioridade seria trazer Michael de volta aos Estados Unidos. Para isso, ele convoca uma reunião com os chefes de todas as famílias para propor a trégua. É essa a cena a qual vou me referir.

Na reunião, pontos de vista são expostos, um quer uma coisa, outro quer outra; para alcançar a "paz", Vito aceita a sua participação nos negócios que, inicialmente, tinha recusado, contrariando, inclusive, seus próprios princípios. Mas negocia seus termos, dizendo que seu filho Michael, que está foragido, está retornando para casa, e ele quer que isso aconteça em segurança. E, com a sua sabedoria, acrescenta (eu não lembrava exatamente as palavras, mas achei melhor copiar o texto como é) "mas eu sou um homem supersticioso; se algum acidente infeliz acontecer a ele - se ele receber um tiro na cabeça de um policial, se ele se enforcar na sua cela da prisão, até se um raio cair nele, então eu vou culpar alguém dessa sala, e isso é imperdoável. Tirando isso, juro pela alma dos meus netos que não serei eu a quebrar a paz que nós estabelecemos hoje".

Lembrei dessa cena em uma conversa que tive recentemente. No contexto do filme, claro que isso tem a ver com o 'modus operandi' da máfia (ou pelo menos com a imagem da máfia que nos chega por livro e tevê): aquela de "fazer as coisas parecerem como acidentes". Vito não podia correr nenhum risco de alguém facilitar, de nenhuma maneira, algo que pudesse causar a morte de seu filho. E ele precisava encontrar uma maneira de deixar isso claro, de tornar todos que estavam naquela sala responsáveis pela segurança do seu filho, sob risco de quebrar a paz que estava estabelecidda - e o fez de forma brilhante.

E o link com essa cena que apareceu na conversa que tive recentemente é o mesmo link que já me apareceu outras vezes. Há situações que realmente não importa a intenção: não importa se a pessoa que fez a cag* quis fazer, se ela só foi descuidada, se ela só teve azar. Tem horas que a gente não tem - ou não pode se dar ao luxo de ter - a energia para descobrir; muitas vezes não é nem possível. Mas se a hipótese mais benevolente para uma pessoa que só faz cag*, ou só se dá mal, é que ela é "muito azarada" - bom, sai com seu azar para lá! Já trabalhei com pessoas assim, já tive "amizades" assim, e é uma m*...tem uma hora que vc não quer saber, e tudo o que você pode fazer é manter distância - assim como Vito Corleone não podia correr o risco de ver seu filho morto para depois tentar descobrir se alguém teve algo a ver com isso. Afinal, "i am a superstitious man...'

sexta-feira, 11 de março de 2011

Aposentadoria

Esses dias conheci um psicanalista de mais de 80 anos que, apesar da aparente falta de necessidade financeira para tanto, ainda trabalha pelo menos 7 horas por dia. Noutro dia tive aula com um professor - uma verdadeira sumidade na sua área de pesquisa - de mais de 70 anos, e não me lembro de ter tido uma aula com alguém tão apaixonado pelo assunto sobre o qual estava falando como ele.

Por outro lado, nos meus 10 anos de vida corporativa, tive contatos com algumas pessoas que se aposentaram ou estavam próximas da aposentadoria. Algumas pessoas aguardavam ansiosamente o dia do tão esperado descanso; alguns gostariam de poder descansar, mas a preocupação com a questão financeira falava mais alto e a proximidade da aposentadoria era motivo de angústia. Quase todos me causavam a impressão de que tinham, fácil fácil, pelo menos 10 ou 15 anos para queimar na empresa, trabalhando com muita produtividade. Cheguei a ter contato com dois ou três que tinham se aposentado, e o relato era o mesmo: após aproveitar um ou dois anos de descanso, estavam procurando algo para fazer, para sentirem-se produtivos. Um deles estava até fazendo trabalhos voluntários, mas ressentia-se de estar cortando batatas, quando poderia usar muito mais do intelecto e da experiência que acumulou durante quarenta e poucos anos de mercado financeiro.

A primeira diferença que vem à cabeça entre os casos que descrevi no primeiro parágrafo e os do segundo é: enquanto os primeiros tem verdadeira paixão pelo que fazem, os segundos tinham no trabalho apenas um meio de vida. A segunda diferença, menos óbvia, é que a profissão dos primeiros permitia um ritmo geral de vida mais adequado às exigências da idade do que a dos segundos, que trabalhavam em empresa. Qualquer um que trabalhe 10 horas por dia e leve todo o dia umas três horas no trânsito provavelmente está contando os dias para mudar de vida...

Essas constatações vem ao encontro de algumas impressões que eu tinha quando trabalhava em empresas. Cada vez mais a pressão sobre os trabalhadores de uma certa idade aumenta: os pacotes de estímulo à aposentadoria, para dar lugar a trabalhadores mais jovens, vem cada mais cedo. No meu último emprego cheguei a ver um pacote destinado a pessoas com 50 anos! Poxa, 50 anos o cara é praticamente um bebê eheehh...tem muita lenha para queimar. Por outro lado, os trabalhadores dessa idade tem sentimentos diversos sobre a situação: muitos anseiam, há muito tempo, esse descanso. Se a condição financeira lhes é favorável (talvez mais por sua baixa expectativa de renda do que efetivamente por uma condição financeira muito boa), a novidade é bem-vinda. Mas isso não exclui a necessidade de ainda sentir-se útil, produtivo. Muitos enxergam essa situação como a oportunidade de, finalmente, fazerem algo a que já gostariam de estar se dedicando há muito tempo. Não consigo deixar de pensar que, fosse o trabalho, de forma geral, menos desgastante, talvez nem esses quisessem se aposentar - talvez usassem o tempo livre que já tem para se dedicarem, satisfatoriamente, a outras coisas.

Eu entendo o ponto de vista das empresas; trabalhadores de uma certa idade, de forma geral, custam caro - os salários foram inchados, nem que tenha sido apenas pelos consequentes dissídios. Muitos não tem o mesmo gás e disposição para se submeter a certas situações de trabalho que os mais novos tem. E, principalmente, a legislação é um forte empecilho: você não consegue readequar a situação do trabalhador para que a situação seja proveitosa para os 2 lados. Digamos, que ao se aposentar, o trabalhador diminuísse sua carga horária para algo como 5 horas por dia - e recebesse o salário proporcional. A empresa, com o custo menor, continuaria a contar com a experiência dele, enquanto o trabalhador, ainda sentindo-se produtivo, e com mais tempo para fazer outras coisas, poderia produzir por muito mais tempo.

O conceito de idade produtiva mudou muito. Minha vó tem 80 anos e encontrou energia para ser síndica do seu prédio. Meu pai já passou dos 60 e ainda tem pelo menos 20 anos de trabalho pela frente. A minha geração deve chegar aos 90 anos com capacidade produtiva boa. Essa separação da vida em fases - uma produtiva e a outra para ficar moscando em casa - não faz mais sentido. Como sociedade, está na hora de pensarmos em forma de utilizar toda essa força produtiva em prol da própria sociedade - o que chegaria, eventualmente, a diminuir a necessidade de esfolar o couro dos que estão na sua fase produtiva. Em vez da vida ser um "rala, se esfola, para depois descansar", a contribuição de cada um na sociedade seria mais contínua e menos penosa.

terça-feira, 1 de março de 2011

Times brasileiros na libertadores

Escrevi esse post uns 2 dias depois da derrota do Corinthians pro Tolima. Acabei não postando e estou postando agora, exatamente como tinha escrito na época. De lá para cá há fatos a serem considerados: Adilson não é mais técnico do Santos, Flu iniciou muito mal a competição, Cruzeiro começou arrasando - fatos que podem tornar as análises mais ou menos furadas. Ainda sim quis postar tal qual escrevi naquela época...

* * *

Com a infeliz desclassificação do meu time na libertadores, resta-me analisar os outros brasileiros que disputarão o torneio. Esses dia assisti um programa esportivo no qual os jornalistas faziam esse análise, e a unanimidade afirmou que Santos e Fluminense são os times brasileiros favoritos para a competição. Tenho lá as minhas dúvidas. Mas que fique claro que, uma vez que Palmeiras e São Paulo estão fora, a análise é realmente racional, e não birrinha de torcedor. Não, não considero o Santos rivaaaaal do Corinthians e tenho até certa simpatia pelo time da baixada.

Fluminense: escrevi um post aqui sobre pontos corridos. O Fluminense é o campeão brasileiro, na minha opinião, em grande parte por ter contratado um técnico especialista nessa competição. Esse tipo de competição, na minha visão, não premia o time com mais capacidade de decisão, de entrar em um jogo decisivo com sangue nos olhos e conseguir a vitória a qualquer custo - que é o tipo de capacidade que o mata-mata exige. Há jogadores bons no Fluminense - Deco, Fred, Conca (embora eu discorde da maioria e ache esse último um belo dum pipoqueiro). Mas acho que o Fluminense tem 3 grandes problemas; o primeiro, o técnico, que é tão bom em pontos corridos quanto é ruim em mata-matas (vide as 4 desclassificações contra brasileiros quando dirigia o São Paulo, sendo que o São Paulo, nos pontos corridos, tinha sido muito superior a esses mesmos adversários); o segundo, é que o time do meio para trás é inseguro, um paradoxo para as características do Muricy, que monta times com defesas muito eficientes. O terceiro, é que não vejo no Fluminense muitos jogadores capazes de segurar uma barra de um jogo pesado de libertardores, ou com muita experiência no torneio. A ver.

Santos: acho que a diretoria do Santos vem tomando decisões acertadas; o trio ofensivo com Ganso, Elano e Neymar tem tudo para ser infernal. Acho que poderiam ter contratado um centroavante melhor - não boto fé no Diogo nem no Keirisson, se tivesse conseguido trazer o Ricardo Oliveira, por ex, seria difícil segurar...Acho o Santos um time com melhor condições que o Fluminense; ainda sim, há alguns poréns; acho que poderiam ter contratado um zagueiro; a defesa, embora não seja ruim, não teve muitas oportunidades de ser testada, nem no ano passado. O time do Dorival ano passado compensava uma eventual insegurança defensvia com muito ataque - era um 433 com só 1 volante de marcação! o time encaixou muito bem e soube se comportar quando enfrentou adversários grandes. Não sei como esse time do Adilson vai se comportar nessas situações; libertadores é uma competição onde se "joga" com a bola no chão muito menos do que os campeonatos no Brasil. Uma dúvida é se os meninos terão a maturidade nos jogos pegados, difíceis. A atitude do Neymar tem me agradadado nesses jogos do sub-20, vamos ver se ele consegue manter a cabeça fria, pq do jeito que ele joga vai ser caçado em campo. O Santos pode estar cometendo alguns dos erros que o Corinthians cometeu em 2009: passeou no segundo semestre e trouxe peças importantes para encaixar no próprio ano da disputa. A demora para dar liga pode custar caro. A última coisa é o Adilson; como corinthiano, sei da capacidade dele de fazer besteiras. Os cruzeirenses também não são muito fãs dele, embora ele tenha sido vice-campeao da Libertadores. Há sempre o risco dele querer inventar alguma maluquice e ferrar o que tava bom.

Inter: engraçado os comentaristas desse programa terem deixado o Inter de fora. Ultimamente tem crescido uma rixa entre Inter e Corinthians, e admito que não tenho nenhuma simpatia pelo colorado. Mas pra mim continua sendo o grande favorito brasileiro esse ano. Na última década foi bicampeão do torneio; o time pode não ser brilhante, mas é muito equilibrado, tem um meio-de-campo muito forte. Ano passado a diretoria abusou do direito de fazer cag*, trocou de técnico 2 vezes, e ainda sim foram campeões. Celso Roth é um técnico que, na minha opinião, goza de muito menos prestígio do que merece. Jogar no beira-rio costuma ser complicado.

Grêmio: outro time que ninguém dá muita coisa, mas acho que pode surpreender. Não gosto do Renato Gaúcho, mas ele já foi vice da libertadores. O Grêmio foi um dos melhores times no segundo turno do brasileiro, e um visitante encardido - parece que o Renato acertou o jeito de jogar fora de casa. Perder o Jonas foi uma besteira; mas o Grêmio é um time que gosta desse tipo de competição, sempre cresce, e é muito difícil jogar no Olímpico. É aquele time que, quando olhar, já tá na semi, e daí pro título são 4 jogos.

Cruzeiro: bom, não fosse o Cuca...acho o time do Cruzeiro muito bem montado. Nos jogos finais do brasileiro o time mostrou muita força: sabia jogar muito bem fora de casa e impor seu ritmo nos jogos em casa. O mineirão vai continuar fazendo falta e seria um verdadeiro milagre o Cuca conduzir algum time a esse título, pelo seu perfil, digamos, um tanto quanto derrotado. Se ele der a sorte de não enfrentar muitas situações complicadas pode ser que chegue longe.

Corinthians: tolimination-tion-tion...ehehe, que m*!!

No mais, acho muito difícil o título não ficar, novamente, com um brasileiro.

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Não existe almoço grátis

Essa expressão é conhecida; significa que ninguém ganha nada de graça. Quando alguém te chama para almoçar e paga o almoço - bom, ponha as barbas de molho...

Tenho andado meio desligado das notícias há alguns dias, e fiquei sabendo recentemente do movimento "passe-livre", que até onde sei, tem como objetivo fazer com que o transporte público em São Paulo torne-se grátis. Parece que o movimento teve como maior detonador o aumento recente do preço das passagens de ônibus em São Paulo. Bom, várias questões me vem a cabeça:

O preço da passagem é justa?

Essa já é uma pergunta complicada - justo para quem, sob qual ótica? Consta das contas públicas que o preço economicamente viável, para cobrir custos e assegurar uma certa margem de lucro às operadoras de ônibus (afinal não vivemos no socialismo nem ninguém é obrigado a fazer caridade) já seria de 3,17, e não 3 reais. Significa que, atualmente, a prefeitura "subsidia" uma parte do preço das passagens para que preço ao consumidor final seja menor. Mas fiquemos, então, com o preço atual: R$ 3,00. Para fazer uma comparação internacional, é algo em torno de US$ 1,80 (isso considerando o câmbio valorizado como está; se o câmbio estivesse a um nível mais razoável esse valor seria abaixo de 1,50 dólar). Não é especialmente barato, mas também não é caro, comparativamente a outras grandes capitais do mundo. A isso, é preciso somar outros 2 fatores. O primeiro são as reduções e gratuidades: estudantes pagam metade; idosos (acima de 60 anos) não pagam; desempregados até 6 meses também tem passe livre. A lógica funciona que nem a meia-entrada do cinema: você, que não tem carteirinha, paga 20 reais porque a maioria, que tem carteirinha, paga 10 - então o preço é ajustado para que a receita fique balanceada. O outro fator é que, já há alguns anos, o sistema de transporte de São Paulo conta com o tal do "bilhete único": você paga uma passagem só para fazer o trajeto que quiser - podendo pegar até 4 ônibus. Se você vai pegar um ônibus e o metrô - ou trem da cptm - você paga um valor reduzido se comparado à soma das duas passagens. Esse critério é justo? Essa discussão fica para depois; mas é claro que isso já beneficia quem anda mais e por mais tempo e pode dar a impressão da passagem ser cara para quem precisa pegar 1 ônibus para andar 10 quadras.


Do ponto de vista conceitual, faz sentido o transporte ser de graça?

Para começar a discussão, é importante a premissa do "não existe almoço grátis". Organizar, por para funcionar, controlar toda uma rede de transporte, por pior que seja, custa dinheiro. Alguém vai pagar - isso está claro, espero. A questão, então, é, se o consumidor direto não paga, quem vai pagar? "Ah, o governo deve financiar". Ok, mas quem é o governo? De onde vem o dinheiro? Vem da gente, do seu imposto, de tudo que é recolhido da sociedade e é transferido - nesse caso - para a esfera municipal. A proposta de tornar o transporte "de graça" significa tirar a conta do usuário e repassar para a toda a sociedade, de forma mais ou menos linear. Faz sentido? Essa resposta passa pelo visão política e filosófica da coisa. Entendo que há certas coisas que a sociedade tem de bancar, de forma geral, e outras que não. Educação, saúde e segurança, ao meu ver, não tem como privatizar totalmente - o estado tem de se responsabilizar por prover essas instâncias, independetemente da questão financeira. Transporte já me parece que não; cada um deve ter a premissa de escolher como, quando e quanto gastar para se locomover. A premissa de que espalhar esse custo de forma aleatória na sociedade é "justiça social" parece-me ingênua. Claro que, falando das classes "macro-sociais", existe uma correlação entre andar de transporte público e renda: gente rica tende a andar de carro, gente pobre tende a andar de ônibus. Mas olhando mais minuciosamente, a coisa não é tão clara assim. Estudantes já pagam um valor bem razoável; estudei em um colégio "de rico" e tinha muita gente que ia para escola de ônibus e metrô. Boa parte da massa trabalhadora que se desloca diariamente de transporte público tem sua condução paga pelos empregadores - trabalhadores CLT, construção civil, domésticas, diaristas etc. A parcela realmente menos favorecida da população não anda muito de transporte público - nas comunidades, muita gente tem emprego informal ali na própria região, ou nem emprego tem. Na classe média (média média ou média baixa), o principal fator para definir se o cabra vai de carro ou de ônibus é a facilidade e economia: se o trajeto de ônibus não for tão pior do que o de carro e se for bem mais barato (como, geralmente, o é) muitas vezes o cara prefere ir de transporte público. Então, retirar esse custo do usuário e repassar linearmente para a sociedade não trará "justiça social" - os grandes beneficiados serão os empregadores, que deixarão de ter o custo do vale-transporte.


E do ponto de vista prático, a probabilidade de ser eficaz é grande?

Nada que é público funciona, em especial no Brasil. Quem pode paga escola particular pros filhos, faz plano de saúde privado, mora em condomínio fechado, anda de carro - o que denota a ineficiência governamental em cuidar de educação, saúde, segurança e transporte. Todo o mundo civilizado já aprendeu isso - a União Soviética, última tentativa significante de nação totalmente controlada pelo Estado, faliu há 2 décadas. Uma proposta que visa aumentar ainda mais a responsabilidade estatal sobre os transportes significa dar outra tartaruga para quem ainda não consegue cuidar nem de uma - manca. Para o Estado "bancar" o transporte, uma das duas coisas aconteceria: ou assumiria o controle total dessa área ou deveria arrecadar mais para fazer frente a esses custos. A primeira hipótese seria um desastre total - se o transporte funciona minimamente é por conta da gestão privada; o Estado não consegue cuidar nem da sua parte, que é o planejamento e os investimentos em estrutura. A segunda implica em dois problemas - mais dinheiro circulando pela esfera pública (mais corrupçao, mais ineficiência), e menos competição para as empresas de transporte - mais comodismo, menos investimento, afinal o Estado sempre vai garantir o dinheiro entrando.


Esse tipo de filosofia e pensamento jurássico sempre encontra alguma nova forma de se manifestar. E ainda escutamos que professores estão divulgando esse tipo de proposta e convocando alunos para participar de manifestações. Imagina a "elite" pensadora que deve estar saindo das nossas escolas...

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

10 músicas brasileiras que eu gostaria de ter escrito

Pensei nesse post há algum tempo; no começo, o título seria "as 10 músicas brasileiras mais bonitas". Mas era muita pressão e eu não conseguia fechar a lista. Depois pensei em mudar para "10 músicas brasileiras bonitas para car$%#..."; foi quando eu me lembrei de que, com frequência, quando escuto alguma música de que gosto bastante, fico com inveja do compositor; penso "pqp, queria ter escrito isso". Daí o nome do post. Embora o principal fator para cada música ter entrado na lista seja a letra, outros aspectos - como melodia, arranjos etc - contribuíram. Em cada uma eu destaco uma parte da letra que especialmente me chama a atenção; a letra inteira não vai (o eventual leitor que quiser que procure...!) Vamos à lista, que não vai em ordem de preferência.

Eu sei que vou te amar - Vinícius de Moraes e Tom Jobim
Fazendo a lista percebi que gosto mais do Vinícius poeta do que do letrista. Claro que ele fez muita coisa bacana, mas a simplicidade, que na poesia dá uma fluência legal, na música as vezes fica corriqueiro. Ainda sim, essa música é um clássico. Ok, a letra pode não ter nada de tão elaborado, mas a combinação da musicalidade, com o poema que geralmente acompanha, e a beleza com que transmite o sentimento, me fazem gostar bastante.

'eu sei que vou chorar...a cada ausência tua eu vou chorar...mas cada volta tua há de apagar...o que essa ausência tua me causou'

Há tempos - Renato Russo
Bom, eu sou do time que curte (bastante) Legião. Sou fã do Renato Russo, pelo talento musical, pela personalidade etc. Poderiam ter outras músicas aqui, mas como eu queria limitar a 10, decidi escolher uma só do Renato. E escolhi essa porque combina tudo: musicalidade, letra bonita, boa para cantar, para tocar no violão, estrutura bacana - não tem refrão. Enfim, pacote completo.

'disseste que sua tua voz, tivesse força igual, à imensa dor que sentes...teu grito acordaria, não só a tua casa, mas a vizinhança inteira...'

Eu te amo - Chico Buarque e Tom Jobim
O Chico cai no mesmo esquema do Renato Russo - se deixar, faz uma lista só de músicas dele. Nesse caso abri uma exceção e coloquei 2 ehehe. Outra coisa: como tem melodia bonita do Tom! (todo mundo deveria conhecer todas as músicas que Tom e Chico compuseram juntos, são todas muito bonitas). Não me lembro de ter ouvido outra música que reflita tão bem aquele sentimento do amor perdido...

'como, se nos amamos feito dois pagãos, teus seios ainda estão nas minhas mãos, me explica com que cara eu vou sair'

Além do que se vê - Marcelo Camelo
Aqui eu admito que é bem menos unanimidade, mas confesso que tive que fazer um certo esforço para só colocar uma do Marcelo Camelo - gosto demais do estilo de composição dos Los Hermanos. Mistura letras bem pensadas, arranjos muito bacanas, musicalidade. Essa aqui, pra quem gosta de violão, é bem legal (ouça alguma versão com o Marcelo tocando acústico).

'é preciso força, para sonhar, e perceber, que a estrada vai além do se vê...eu sei, que a tua solidão me dói, e que é difícil ser feliz, mais do que somos nós...'

Tocando em frente - Renato Teixeira
Para contrapor, um clichezão; ainda sim, a música é muito bonita. É um exemplo de como profundidade e simplicidade podem andar juntos...

'ando devagar porque já tive pressa e carrego esse sorriso, porque já chorei demais...' (essa frase é do car*...!)

Oceano - Djavan

Para mim, Djavan é meio que nem Caetano: gosto mais das músicas pelas construções musicais, pela fluência, do que pela letra - para falar a verdade, boa parte das vezes não entendo patavinas do que eles estão tentando dizer. Oceano é um pouco assim, embora a letra tenha partes bonitas Mas o conjunto é que fica bom - a melodia é muito bacana e encaixa muito bem na letra.

'você desagua em mim e eu oceano...e esqueço que amar, é quase uma dor....'

Detalhes - Roberto Carlos
E não podia faltar uma do Robertão, né...são tantas emoções! eheh talvez tivessem outras para escolher, mas eu gosto muito dessa.

'eu sei que esses detalhes vão sumir, na longa estrada...no tempo que transforma quase tudo, em quase nada...'

Você - Raul Seixas

Toca Raul!! essa letra é um soco no estômago - é uma daquelas na qual o Raul demonstra seu entendimento das coisas como elas são, a despeito (ou por causa?) de todas as drogas e maluquices.

'por que deixar que a vida lhe acorrente os pés...e finge que é normal estar insatisfeito'....

Minha namorada - Carlos Lyra / Vinícus de Moraes

A outra de Vinícius da lista; gosto muito dessa letra...tenho um amigo que pediu a (hoje) esposa em namoro tocando essa música no violão ehehe... um tanto machista, mas pela época que a música foi composta, e conhecendo um pouco da hístória e da personalidade do Vinícius, totalmente compreensível.

"você tem, que vir comigo em meu caminho, e talvez o meu caminho, seja triste para você..."

Partido Alto - Chico Buarque

Quando eu defini que seria justo ter pelo menos 2 do Chico, foi difícil fechar a segunda; mas quando me lembrei de Partido Alto, não saiu mais da lista. Chico tem a capacidade de combinar a construção musical com a mensagem da música; essa letra toda de exposição do jeitinho brasileiro, da malandragem, tocada num sambinha com muita ginga. É muito bom.

'Deus é um cara gozador, adora brincadeira, pois para me jogar no mundo tinha o mundo inteiro, mas achou muito engraçado me botar cabreiro, na barriga miséria eu nasci brasileiro' (versão original devidamente censurada pelo ufanismo da ditadura)

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

depois reclama...

Esses dias precisei de um serviço de chaveiro para carro. O guincheiro indicou um cara aqui perto de casa; ligamos para ele e ele foi - chegou 3 horas depois do que tinha combinado. Começou o serviço, precisou vir 2 vezes a mais do que tinha estipulado no primeiro encontro e levou 2 dias a mais para completar o serviço. Com o agravante de que, toda vez que precisava ir, atrasava-se pelo menos 2 horas. Depois da terceira ligação nossa "onde você tá car*#$WW" ele não atendia a ligação até chegar aqui. Cara educado, até prestativo, mas nunca mais vou chamar ele.

Dois spots de luz aqui em casa morreram - nem trocando a lâmpada acendia. Chamei um eletricista que faz serviços no prédio - ele veio com um assistente, deu aquela olhada e mandou ver: precisava trocar os spots. Tive motivos para desconfiar daquele diagnóstico, mas como entendo tanto de eletricidade quanto de sapateado, fiquei quieto. Meia-hora depois, chega só o assistente dele para trocar as peças: o que faz diferença, porque fui eu que tive que ficar segurando a escada pro cara não cair. Mexe daqui, mexe dali, o cara descobre que o problema não é aquele - tem um fusivel na casa de disjuntor queimado. O cara vai pegar a peça para trocar, mas aí combino com ele um horário, porque eu não podia esperar. Você chegou aqui no horário combinado? Ele também não...No dia seguinte, o cara aparece num horário x, dá alguma explicação tosca pro sumiço e troca o fusível, mas o problema continua. Mexe daqui, mexe dali, precisa voltar para falar com alguém mais experiente, porque ele não sabe bem o que é. De tarde aparece o cara que realmente manja: em meia-hora resolve o problema. Mas o cara quer cobrar um preço final que era o triplo do combinado, porque, afinal, "precisamos fazer mais coisa" - só que o erro foram deles mesmos ao diagnosticar errado.

Quando eu encontro algum profissional, em qualquer área, que seja bom - por bom, entenda-se honesto, dedicado e minimamente competente - é comum não largar mais o cara; até se eu mudo de bairro e é possível fazer serviços com o cara, eu faço. Indico para todo mundo que puder. O problema é que é tão difícil achar né...e eu nem sou muito exigente; é só o cara cumprir mais ou menos o prometido, cobrar um preço razoável e não ser completamente descompromissado. Mas, ainda sim, é difícil...

Um conhecido meu, quando via alguém fazendo cag*, costumava falar "depois reclama que filho de pobre não tem sorte". Ou, no caso, "depois reclama que o país não tem oportunidade, que não tem trabalho, que o mundo é injusto"...

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

barganha, semi-blefe

Outra boa de um seriado americano de que gosto: The Good Wife. O pano de fundo é a história da esposa do Promotor público de Chicago (que nos EUA é um cargo eletivo), cujo marido é deposto e preso após um escândalo sexual. A protagonista, que tem sido dona-de-casa por 15 anos, tem de recomeçar a vida profissional como estagiária em um escritório de advocacia. Gosto do seriado, principalmente, pelas questões jurídicas envolvidas: como os casos correm, a relação advogados x juízes, promotoria x defesa etc.

Pois bem, mas o post é sobre outra personagem: Kalinda, uma investigadora do escritório onde a protagonista trabalha. Muitos dos casos que o escritório ganha vem das investigações dela, mas ainda sim ela se sente - e parece que é - desvalorizada; já em outros episódios ela tinha mostrado descontentamente pelo salário (por ex, quando descobre a fortuna que o escritório paga para um consultor de júri). Mesmo demonstrando claramente sua insatisfação parece que nada é feito de muito concreto para melhorar a situação dela. Para piorar, outro investigador é contratado que, aparentemente, ganha mais e tem mais prestígio com os sócios do que ela.

Até que, no episódio que assisti recentemente, ela decide agir. Aproveita que existe a oportunidade dela ir trabalhar em outro escritório - e seus chefes sabem disso - e pede um grande aumento, bem como outras condições de trabalho. Como, de costume, seu chefe fala "vamos ver o que pode ser feito", ela percebe o "enrolation mode: on" dos seus chefes e também começa a trabalhar em 'operação padrão' - só faz o básico, em vez dos constantes coelhos da cartola que ela costumava tirar para ajudar nos casos. Quando isso começa a prejudicar os casos importantes dos sócios, o que obviamente acontece é que ela é promovida.

Ok, é um exagero televisivo, mas é exatamente assim que acontece em empresas. É perfeitamente possível - aliás, é comum - duas pessoas que desempenham tarefas parecidas e tem habilidade equiparáveis ganharem salários muito diferentes. E isso vem do simples fato de que, assim como em qualquer outro produto, a mão-de-obra obedece a lei de oferta e demanda. Você não vai pagar 10 por um produto que pode ser comprado por 5. Você até pague se a loja que vende por 5 só tem uma unidade e você precisa de duas - mas naquela unidade cujo preço é 5 é 5 que você vai querer pagar. Porque o chefe seria otário o suficiente para fazer diferente? Se tem alguém que aceita - sem reclamar, ou pelo menos sem tomar atitudes sérias a respeito - receber 5, porque vou pagar 10? A "mercabilidade" (hein?) é o fator preponderante para determinar quanto alguém vai ganhar. Não me considero o cara mais "adaptado" ao corporativismo, mas sempre me irritou muito as pessoas que reclamavam dessa dinâmica. As coisas são como são - reclamar disso é que nem achar ruim a lei da gravidade ou que chocolate engorda.

Nunca vi alguém crescer rápido ou ter um salário acima da média sem essa "mercabilidade"; e isso se compõe de várias características: marketing pessoal, capacidade de causar uma boa impressão, contatos e possibilidades de mudar de emprego. Seu chefe pode realmente achar que você poderia ganhar mais do que ganha, mas ele estará muito mais disposto a pagar quando acreditar que o risco de outro alguém pagar é grande.

No poker, embora o imaginário comum pense ser muito frequente o grande "blefe", tem um movimento que é muito mais usado e lucrativo: o semi-blefe. Isso acontece quando você aposta com uma mão que provavelmente não é a melhor, mas como ha ainda cartas por vir, a probabilidade dessa mão melhorar não é pequena. A jogada é lucrativa porque há 2 formas de vencer: quando seus oponentes desistem da mão ou quando eles pagam, mas ainda sim sua mão melhora e você vence. Nessa situação, seu principal objetivo é fazer com que seu oponente desista, mas se ele não desistir, também tudo bem. Essa situação que descrevi, do profissional barganhando, me lembrou muito essa jogada. Porque assim como o blefe puro é poucas vezes lucrativo, a barganha do profissional tem de ter uma saída - isso é, a pessoa tem de estar realmente disposta a mudar de emprego se as coisas não saírem como ela quer. E isso exige também outras características, como disposição para encarar novos desafios, sair da zona de conforto, reconquistar seu espaço em um lugar novo - coisas que, a maioria das pessoas - eu inclusive, quando trabalhava em empresa - não tem. Some-se a isso a tal da "mercabilidade" e temos a explicação de porque 2 pessoas podem desempenhar a mesma função e ganharem salários bem diferentes.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Into the Wild

Cris McCandless era um jovem americano, de família de classe média alta; ficou famoso quando seu corpo foi encontrado em um ônibus abandonado no meio do mata do Alasca, e Jon Krakeuer escreveu uma reportagem a seu respeito. Dois anos antes de ser encontrado morto, Cris havia se formado no college e, tendo ja demonstrado anteriormente apreço por viagens longas e com poucos recursos, saiu em uma viagem pelo país sem comunicar ninguém da sua família. Ao longo desses 2 anos, planejou o que chamava de "aventura derradeira": passar algum tempo no meio do mato no Alasca, sobrevivendo com seus poucos e próprios recursos.

Após escrever a matéria, Krakeuer interessou-se tanto pela história que escreveu um livro. Sean Penn adorou o livro e fez um filme("Na natureza selvagem"). Conheci a história pelo filme (que assisti mais de uma vez) e acabei lendo o livro, o que me ajudou a formar novas opiniões, pois os 2 tem, em alguns momentos, enfoques diferentes. Não sei qual é o propósito desse post; acho que como acabei de ler o livro, queria tecer alguns comentários gerais, sem nenhuma rigidez. Se o eventual leitor não está familiarizado com a história, a leitura será desinteressante, pois não é meu intuito contar os detalhes.

Tomando-me como exemplo, tendo a achar que o fascínio que essa história exerce tem a ver com o imaginário moderno, essa certa vontade que muita gente tem de viver alguma aventura, uma vida não entediada por laços sociais, obrigações, menos apegada a bens materiais (embora carpe dien e fugere urbem não sejam conceitos propriamente modernos). Cris encarna bem o "cara inteligente, legal, que poderia ser muito bem sucedido mas teve a coragem e espirituosidade para tentar levar uma vida mais simples e sincera". Cris fez questão de sobreviver com poucos recursos, de recusar o conforto, o luxo. Pelo que sabemos da história dele, a viagem de Cris não deixa de ter um forte tom de crítica social - uma crítica aguda ao american way of life, o ápice da desvirtuação das relações e dos valores dos quais o capitalismo é capaz. É compreensível porque isso desperte tanta paixão: vai ver um profundo e generalizado vazio nas pessoas, uma ausência de sentido e a angústia propiciada pela vida moderna sejam os invólucros ideais para que esse tipo de história encontre eco.

Parece-me que Sean Penn optou por uma visão mais romantizada e filosófica da história; Jon Krekauer, nos momentos do livro em que, claramente, transmite sua opinião pessoal, parece bem simpático a vários aspectos da história de Mccandless. Mas não se furta a debater - até porque o veículo "livro" lhe permite - com mais detalhes, outras considerações.

Tem muita gente nos EUA que considera Cris um grande babaca - um menino mimado, ingênuo, que teve a arrogância de enfrentar a natureza sem estar minimamente preparado para tal. Mas como tudo que invoca paixão mereça ser analisado, vale também para o outro lado: porque tanta raiva dele? Krekauer conta que, quando escreveu a história, recebeu muitas cartas de pessoas indignadas com essa certa idolatria pelo que Cris fez; em especial, alasquianos, que moram em um estado que está acostumado a esse tipo de evento - "malucos" fazendo experiências temerárias com a esperança de que a natureza bruta curará suas decepções. Na opinião do autor do livro, essa indignação teria a ver com o espelho de que a história do Cris fornece às pessoas - um reflexo de tudo que as pessoas tem de sufocar e abdicar para viver suas vidas enquadradas no modelo.

Há considerações práticas nessa discussão. Somente como exemplo: Cris não carregava um mapa topográfico da região na qual ficou no Alaska (deve ter tido motivos, senão práticos, psicológicos, para tal). Se tivesse um mapa, saberia que, quando não conseguiu atravessar o rio de volta, porque o mesmo estava na sua cheia, conseguiria ter atrevessado o mesmo andando 2 km ao sul - e provavelmente teria sobrevivido. Por outro lado, ele já tinha sobrevivido - muito bem, obrigado - por 3 meses naquela região com seus próprios recursos. Sua assunção de que sobreviviria sem problemas por mais um ou dois meses, até que o fluxo do rio diminuisse o suficiente para que fosse "atravessável", está longe de ser "maluca". Outra polêmica é a causa de sua morte - há várias suposições e nenhuma certeza. Jon Krakeuer duvida da versão corrente - e aceita por Sean Penn no filme - de que Cris confundiu duas sementes diferente e tenha comido a venenosa no lugar da comestível. Não faz muito sentido - há evidências de que Cris tenha colhido as sementes corretas por 3 meses; porque, de uma hora para outra, iria se confundir? A hipótese que ele lança, embasada por alguns botânicos, é de que, mais tarde, Cris passou a comer as vagens da planta comestível também com as sementes - e essas sim, embora não esteja descrito em nenhum livro, são venenosas. Esse não seria um erro bizarro de um incompetente desavisado, mas um infortúnio que, junto com uma conjunção de infelicidades, levou a sua morte.

Há as questões psicológicas; os críticos de toda essa história levantam todas as hipóteses - problemas com os pais, desequilíbrio, homosexualismo. Krekauer aponta bem que esse tipo de "pscinálise pós-mortem" não leva a lugar algum; apenas não possibilita ao "analisado" participar da sua própria análise. Fica claro que Cris tinha problemas familiares, e críticas sérias aos seus pais - aparentemente, nada muito mais grave do que nós todos temos. Talvez ele apenas tenha lidado com isso de maneira diferente. Com meu gosto por questões psicológicas, não consigo deixar de olhar para elas. Jon Krakeuer reconhece em Cris o que reconhecia em si mesmo anos antes - quando ele mesmo fez uma viagem para escalar um pico no Alasca e quase morreu: um certo dilema do porco-espinho, uma necessidade de ficar sozinho, de querer acreditar que ficará melhor sozinho mas que, em algum momento, reconhece a falta que o contato humano lhe faz. Parece que nas suas viagens Cris lidou, frequentemente, com esse dilema: fez amizades sinceras com pessoas que conheceu, mas em algum momento sentia uma vontade incontrolável de afastar-se. Há indicações que, ao final do seu período do Alasca, ele estava pronto para criar relações humanas mais profundas: grifara trechos de Tolstoi sobre a felicidade em uma comunidade, em volta de pessoas, bem como uma parte de Dr. Jivago que cita bem claramente "a felicidade só é real se compartilhada". Nunca saberemos se essa experiência teria realmente esse efeito terapêutico nele.

O traço em Cris que, por assim dizer, não consigo "perdoá-lo" (!!), é o que fez com sua família...tenho dificuldades em conceber algo de tão mal que seus pais o fizeram para justificar a dor insana que (imagino) ele os causou. Esse instinto de não causar tanta dor poderia ter falado mais alto do que qualquer consideração filosófica ou racional; tanto assim que, embora tenha conhecido muitas pessoas não tradicionais em sua viagem, a maioria delas tentou convencê-lo, sem sucesso, a contatar a sua família.

Obviamente, não conheço Sean Penn, nem tenho como saber suas motivações no filme. Mas me parece que sua abordagem "filosófica" foi muito feliz (sem contar a fotografia e trilha sonoro maravilhosas do filme). Olhar para o "exemplo" e pensar sobre questões práticas não são mutuamente excludentes. É provável que Cris fosse desequilibrado; que tenha encontrado uma maneira "esquisita" de lidar com suas frustrações. Ainda sim, é uma história linda. As histórias de heróis que conhecemos, que são contadas, não são as do equilibrados e sãos que dosaram adequadamente cada risco. São os de que, em algum momento, preocuparam-se menos com sua integridade física e mais com outra coisa. Sei lá, pode ser. O que você acha?

domingo, 6 de fevereiro de 2011

direita, esquerda

Eu tinha escrito esse texto na época das eleições, mas por alguma razão, acabei não postando. Agora vai...

Direita e Esquerda, em política, são termos oriundos da Revolução Francesa, na qual a burguesia, revolucionária (quem escuta o termo 'burguês' hoje em dia e desconhece História não imagina que a Burguesia, um dia, já foi revolucionária), ficava à esquerda no Parlamento, enquanto a Aristrocracia, conservadora, ficava à direita. Desde então, em política, usa-se o termo para caracterizar, de maneira bem genérica, alinhamentos políticos. A esquerda seriam os revolucionários, os que desejavam subverter (sem sentido depreciativo) a ordem estabelecida, em especial para estabelecer direitos e oportunidades iguais a todos - por extensão, a esquerda fica caracterizada como os que buscam, então, justiça social. A direita seriam os conservadores, do ponto de vista de costumes - que querem manter a ordem e o respeito a certas circunstâncias estabelecidas - e, do ponto de vista econômico, a partir do Século XX, partidários de uma economia liberal.

Não sou cientista político, mas parece óbvio, e muitos especialistas afirmam isso, que a classificação em direita e esquerda, hoje em dia, perde muito o sentido. Torna-se uma simplificação de uma gama de pensamentos que se alinham e desalinham, em cada aspecto da administração pública correntes ideológicas diferentes podem ter opiniões parecidas ou completamente divergentes. Mas como é comum, ainda hoje, usar essa divisão, vamos lá.

Onde está a Direita no Brasil? Hoje, em época de eleição, vemos um campo partidário completamente polarizado entre dois grandes partidos de centro-esquerda: PT e PSDB.(Nesse ponto imagino que alguém que esteja, eventualmente, lendo esse texto, possa ser pergunta "epa, PSDB de centro-esquerda?", então acho justo fazer uma pequena digressão: sim, centro-esquerda, com certeza. Tenho minhas críticas e minhas aprovações aos 8 anos de governo FHC no Brasil, mas um governo que aumentou impostos, não desinflou o Estado e criou uma estrutura de distribuição direta de renda, que serviu de base para que o governo posterior fizesse o bolsa-família, não pode ser considerado de direita em nenhum lugar do mundo. Inclusive, comparando a política macro-econômica dos 8 anos de governo do PT com as criticas que José Serra já fazia à política econômica do Malan, e não restará dúvidas que, em termos de economia, Serra poderia ser considerado à esquerda do PT!). A "opção alternativa" na eleição presidencial é uma candidata claramente identificada com setores de esquerda - inclusive recém saída do PT. Entre os nanicos, aqueles partidos com traço de intenção de voto e que tem 30 segundos na propaganda eleitoral para passar alguma mensagem são, quase todos, de extrema esquerda - PSOL, PSTU, PCO etc. Então, cadê a direita?

Alguém, provavelmente simpático aos ideias de esquerda, poderia perguntar: po, isso não é bom? Não é uma evolução política que não haja mais espaço para esses reacionários, conservadores? Muito pelo contrário. Não estou questionando preferências políticas individuais, estou discutindo espaço social para repercussão de idéias diferentes. Nos Estados Unidos, republicanos (mais associados ao conservadorismo) e democratas (mais associados ao que se assemelha a setores de esquerda) tem tanto equilíbrio de poder que, invariavalmente, acabam se revezando no governo de 8 em 8 anos. Dependendo da questão crítica no momento, pode pender mais para um lado ou para o outro. Na maioria dos países fortes da Europa, como Inglaterra, França e Alemanha, a direita tem apresentado uma força eleitoral crescente, chegando a ganhar até eleições em determinados momentos. E só o Brasil é politicamente evoluído o suficiente para ter "banido" a direita do mapa?

Mesmo que se continue usando os termos genéricos "esquerda" e "direita", é forçoso estabelecer em quais aspectos as diferenças aparecem. A esquerda está associada, diretamente, com quem deseja mais justiça social. Por extensão, a defesa de uma melhora na educação, na saúde, no transporte público, mais emprego, aumento da renda etc, ou seja, tudo que signifique melhora de vida, em especial para a população de baixa renda, fica caracterizado como exclusividade da esquerda. É justamente um discurso político que, entre a década de 90 e os anos 2000, o PT ajudou a disseminar: não é possível haver uma discussão de método, de meios para alcançar os diferentes fins; se você discorda, é porque você é contra a melhora, a justiça social. No Brasil, "direita" é reacionário, é elitista, é aquele que quer manter o status quo, porque assim a sua dominação maléfica permanecerá oprimindo os mais pobres (aperte a tecla sap, por favor). Em pleno século XXI, é uma sandice pensar que qualquer político, com um projeto de governo mininamente razoável, não considere que educação, saúde, transporte, habitação, segurança pública etc não sejam prioridades. O que difere, em essência, é o meio pelos quais cada corrente ideológica imagina ser melhor alcançá-los. Se a economia não vai bem, e falta emprego, um governo de esquerda estabeleceria que cabe ao governo criá-los, por meio de estatais, obras públicas, ou até minimizar o problema por meio de distribuição direta de renda. Um governo de direita estabeleceria que cabe ao governo criar as condições favoráveis para que a iniciativa privada voltasse a investir, estimulando a economia e gerando empregos de forma sustentável. Um governo de esquerda acredita em um Estado forte, poderoso, atuando em diversos setores da economia, com uma forte regulamentação da vida econômica. Um governo de direita acredita que o Estado deve ser manter apenas onde sua função é essencial, como saúde, educação de base e segurança; que em todos os outros setores deve haver regulamentação, mas que a iniciativa privada, devidamente regulamentada e controlada, é muito mais eficiente e menos sujeita a corrupção para tocar as atividades da economia. Como utopia, um governo de esquerda acredita, no final das contas, que todos são iguais e, portanto, deveriam ter as mesmas coisas. A utopia de um governo de direita é que todos devem ter a liberdade para exercer as suas opções e, portanto, cabe ao estado garantir o mínimo para uma sobrevivência digna de todos, como forma de assegurar a liberdade - mas que a partir daí cada um constrói a sua vida da maneira que bem desejar. Um governo de esquerda pode conceber que, em nome da justiça social e do aumento da igualdade, que alguma pequena transgressão possa ser cometida, inclusive em nível institucional, se no final das contas essa transgressão for positiva para esse objetivo maior. Um governo de direita atesta que o respeito aos princípios da democracia e da constituição está acima de tudo - em suma, que os fins não justificam os meios.

Será que essa oposição de ideais é tão absurda a ponto de, hoje, inexistir direita no Brasil? No período anterior e durante a ditadura, era comum a expressão "comunista come criancinha". Hoje em dia quem come criancinha é direitista reacionário...

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Discos, Lacan, Lógica

Em um livro que estava lendo recentemente, tomei contato novamente com uma historinha que já tinha lido há muitos anos. É um conto sobre 3 prisioneiros que terão a oportunidade de se libertar, ao passarem por um enigma; quem descobrir a solução, consegue a liberdade. O chefe do presídio dispõe de 5 discos - 3 brancos e 2 negros - e colará um deles, nas costas de cada prisioneiro, de forma que um prisioneiro consegue ver os discos nas costas dos outros dois, mas não o seu próprio disco. Quem anunciar primeiro ao chefe do presídio de que cor é o seu próprio disco e, mais importante, porque chegou a conclusão, ganha a liberdade. Depois de algum tempo de hesitação entre os 3, um deles chama o chefe e anuncia a cor do seu disco. Qual era a cor?
A resposta intuitiva - e correta - é branco. A lógica é a seguinte: a hesitação dos 3 prisioneiros ao ver os discos dos outros 2 atesta que não poderia haver 2 discos pretos nas costas de 2 prisioneiros, senão o terceiro prisioneiro imediatamente saberia que o seu disco seria branco. Sabe-se, então, que cada prisioneiro pode ter visto um disco branco e outro preto ou 2 brancos. Ora, o prisioneiro que descobriu o enigma sabia que os outros 2 também sabiam dessa primeira premissa (ou pelo menos podia imaginar que fossem inteligentes o suficiente para tanto); ainda sim, nenhum dos outros dois tinha se manifestado. Se o disco nas suas próprias costas fosse negro, algum dos outros 2, por conta da primeira premissa apresentada e por ninguém ainda ter apresentado a solução, saberia que o seu próprio disco era branco, e logo apresentaria a solução para libertar-se. Como a hesitação continuasse, o seu próprio disco só poderia ser branco (na verdade, os 3 só poderiam ser brancos para que a solução do enigma por parte dos priosioneiros não fosse trivial).
A primeira vez que tomei contato com esse conto foi no famoso livro "O homem que calculava" de Malba Tahan, que li quando criança (essa história, junto com a das escravas vendadas e da divisão dos pães foram as que mais fascinaram na época). O ponto é que o livro em que reli, esses dias, esse enigma, é sobre psicologia - na verdade, aparece como uma referência a um dos seminários de Lacan, que justamente usa esse conto para formular seu conceito de tempo lógico, característica tão conhecida na psicanálise lacaniana. Não é interessante que algo tão lógico e matemático tenha tenta relação com algo, digamos, tão subjetivo como a psicanálise?