quarta-feira, 30 de março de 2011

Planejamento financeiro

Eu não costumo ler colunas de jornal ou prestar atenção em participações especiais em rádio ou tv desses consultores financeiros; geralmente eles não falam nada que a gente já não saiba, ou pior, inventam alguma coisa totalmente sem sentido ou sem utilidade prática. Por força das circunstâncias, assisti uma pequena palestra dum famoso consultor chamado Gustavo Cerbasi, e acabei lendo um livro dele. Foi a primeira vez, que eu me lembre, de algum consultor ter falado algo diferente e que fizesse, para mim, muito sentido.

Não, ele não nega a premissa de que é preciso guardar dinheiro - e, para isso, é preciso gastar menos do que se ganha. Mas uma coisa que me chamou a atenção foi a maneira que ele propõe de organização de gastos que, além de diferente do que costumeiramente consultores financeiros propõe, era algo que eu fazia instintivamente. Primeiro, para começar, é preciso estabelecer o quanto se quer guardar por mês. Até aí, nenhuma novidade, inclusive na dificuldade de colocar em prática - a gente costuma ver quanto "sobra" no final do mês, e não determinar que se quer guardar x% do que ganha...mas vá lá: assim como outros consultores, ele propõe que, quem tenha dificuldade de disciplinar-se a guardar aquele valor, assuma um compromisso mensal - como a prestação de um apartamento ou de um consórcio de alguma coisa - de modo que, assim que o dinheiro caiu na conta, aquela parcela já saia automaticamente.

E aí vem a inversão interessante. O mais comum de fazermos é "começarmos" a estabelecer os nossos gastos por aqueles chamados gastos "fixos", estruturais - casa, carro etc. Tomamos esses gastos meio como dados - "ah, gasto x com o apartamento, mais y com o carro..." - e, o que sobra, fica para as coisas do lazer. Ele propõe a inversão da ordem dos gastos - que, depois de se ter "guardado" o percentual determinado, estabeleça-se o quanto vai se gastar (mais ou menos) com seu lazer primeiro - saídas, compras etc, e aí acomode-se os gastos fixos com o que sobrar. Antes de analisar isso mais a fundo, eu entendo que há importantes motivos para essa inversão.

O primeiro é quantitativo: gastos com estrutura geralmente são muito mais significativos - de modo que alterações desse tipo de gasto apresentam mais diferença. Por ex, há uma conta de que a gente gaste, em média, 2% do valor do carro por mês (em seguro, ipva, depreciação, custo do dinheiro que poderia estar investido, manutenção, as vezes garagem adicional, sem contar gasolina, apenas gastos ligados ao simples fato de ter o carro). Então, se você tem um carro de 40 mil reais, em média você gasta 800 reais por mês com ele. Os gastos para morar dessa pessoa, então, devem ser bem maiores do que isso...O tamanho da diferença que um alto ou um baixo gasto nesses aspectos pode produzir é grande se comparado a gastos de lazer (sem exageros), onde a diferença de alguma alteração pode não ser tão significativa. O segundo aspecto importante é a sustentabilidade de certos cortes de gasto. Tem aquele exemplo conhecido do cafézinho: se você deixar de tomar aquele café da tarde, que custa 2 reais, em dez anos você terá economizado 8 mil reais. Ok, mas quanto isso te custou em qualidade de vida, se esse é o momento que, toda tarde, você sai para descontrair um pouco, conversar com os amigos? Será que isso não afetará até a sua produtividade, podendo te prejudicar muito mais financeiramente? Embora sempre haja espaço para cortar gastos eventuais com lazer, há sempre o limite da sustentabilidade: será que aquele nível de consumo tão baixo é sustentável a longo prazo, sem te enlouquecer? Porque o que acontece é que pensamos "ah, mas se eu só gastar X com lazer, vai sobrar alguma coisa para guardar"; só que aí você compra uma roupa que viu, alguém te chamou para ir em algum lugar mais caro, faz 3 anos que você não sai de férias e...bum! lá se foi o que você ia guardar...O que nos leva a um terceiro motivo: uma mudança de padrão em um custo fixo (para cima ou para baixo) é uma mudança para todos os meses - aquele dinheiro sobra ou falta todo mês. Um corte em um gasto de lazer (por ex, não sair naquele final de semana) produziu um efeito específico naquele mês, mas para o efeito ser repetido, no próximo mês você deverá fazer o mesmo sacrificio.

Claro que não tem mágica; ele não sugere, então, que não haja controle ou parcimônia nos gastos com lazer, sem o que não há planejamento financeiro possível. Outra coisa óbvia mas que não custa falar é que esse tipo de lógica se aplica às pessoas cuja situação financeira permite algum tipo de arranjo - o trabalhador que ganha salário mínimo e mal consegue por comida na mesa é outra história. Mas ainda sim gostei da lógica que ele propõe que, como falei, pareceu-me bem destoante daquele coro velho e batido dos consultores financeiros...

sábado, 26 de março de 2011

BBB - texto do Rica Perrone

Há algum tempo eu queria escrever algo sobre o BBB; até esbocei, mas não foi muito longe. Agora o Rica Perrone escreveu um que, bem, era bem o que eu queria dizer ehehhe...apenas um adendo quanto aos "metidos a intelectuais": eu conheço pessoas que não perdem tempo com bbb porque, realmente, interessam-se por coisas com mais conteúdo. Mas na maioria das vezes as pessoas com o discurso que ele cita no texto realmente perdem tempo com coisas até piores...bom, segue lá:

O BBB que eu queria
Como a maioria, vejo o BBB sempre que possível. E gosto. Não, não farei o tipo de dizer que “é um lixo” pra assistir escondido.

Dizem os metidos a intelectuais que é um programa “sem conteúdo”. Eu nem acho tanto assim. Mas concordaria, porém, se alguém me falasse que é um programa repetitivo.

Toda edição a gente vai ver os 14 pra saber se tem conhecido. Não tendo, assistimos de vez em quando e ficamos sabendo o que rola pelas chamadas da Globo e capas de todos os portais web do país.

No primeiro dia eles cantam, pulam, se juram amigos e fazem promessas coletivas de “vamos fazer o melhor BBB! UHUUUUUUUU!”. Sempre tem um pra gritar: “Sem briga, galera! Na paz! Temos que dar exemplo pro Brasil!”.

Todos os demais, imediatamente, seguindo a mania pouco normal da juventude atual, gritam: “Uhuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu!!!!!!!!!!!!!”, que traduzindo quer dizer: “Uhuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu!!!!!!!!”.

Em casa eu penso: “Quando será que vai aparecer um cara pra dizer, no primeiro dia da casa “Ae galera! Vamo fecha o tempo nessa porra porque quem tá em casa quer ver o circo pegar fogo! UHUUUUUUUUU!”?

Todos sentam na mesa e vem aquele jogo de perguntas e respostas pra se conhecer melhor. É sensacional!

“Eu odeio falsidade”, diz a primeira.

“Quer me ver puta? Gente falsa. Ahh… eu não suporto!”, diz outro.

“Eu odeio fofoca. Acho que quer falar? Fala na cara, sabe…”, diz outra topeira.

E eu, sonhando em casa com um que vai colar dizendo: “Porra, me amarro em falsidade. Não falo na cara, faço joguinho e acho que vocês estão confundindo isso com o Parque da Monica”.

Seria meu ídolo.

Começam as sondagens pra saber a situação amorosa de cada um.

A gostosa diz: “Tô solteiríssima!” E a turma: “Aeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeee!!!!!”

A feinha diz: “Eu to livre”. E um, normalmente viado, grita: “Uhuuuuuuuuuuu!”, sem companhia.

Até que passam os dias, eles vão se conhecendo e achando que são melhores amigos ha 10 anos.

O primeiro chora, e logo surge alguém que nunca viu o cara na frente pra dizer: “Cara, você é guerreira! Sabe quantos queriam estar aqui? Tipo, você já é uma vencedora!”.

Hã?

Vem o paredão e o confessionário me faz mudar de canal. São 14 caras que entram lá pra dizer: “Porra, adoro essa pessoa, mas é por afinidade, sabe? Já que tem que votar, vai no XXXXXX. Mas ó! Adoro ela!!!!”.

Vou sair comemorando nu na varanda quando alguém disser: “Eu voto no Ciclano porque acho ele um cu!”

Ah que beleza seria. Mas não será.

Eu me divirto. Não exatamente com o que eles falam, mas pensando no que eu gostaria que eles falassem.

Quando um emparedado fica, ao invés de gritar “Obrigado Brasiiiiiiiiiiiiil!” no jardim, espero sempre que ele vá até a porta e grite: ‘Chuuuuuuuuuuuuuuupa Ciclano!” pro que saiu.

Mas eles são muito previsíveis.

abs,
RicaPerrone

quinta-feira, 24 de março de 2011

Sobre ganhos e gastos

Uma vez, em uma conversa com meu irmão e com meu pai, não sei porque o assunto estava em planejamento financeiro, e em algum momento eu falei "pois é, porque sempre se deve ganhar mais do que se gasta...". E eles me olharam com uma cara esquisita, e um deles respondeu "não né, é o contrário, gastar menos do que se ganha", no qual o outro, no mesmo momento, concordou. Claro, a curto prazo, em qualquer planejamento financeiro tem-se muito mais controle sobre o quanto se gasta do que quanto se ganha; a variável "ganhos" é incontrolável: você tem o seu salário, ou o quanto a sua empresa consegue faturar, ou quantos clientes você tem etc - embora você sempre esteja fazendo esforço para aumentar a sua renda, os resultados serão sempre indiretos e a longo prazo. Agora, sobre os seus gastos você pode atuar da maneira que bem entender.
Mas não foi bem aquilo que eu quis dizer - talvez não tivesse a ver com a conversa do momento, mas era uma idéia que estava na minha cabeça. Tratando-se de filosofia de vida - e não de planejamento financeiro puro e simples - acho que a gente não lida com essa questão de ganho x gasto de uma maneira adequada. A maneira mais comum de se lidar com essa questão é como se a variável "ganhos" fosse a variável indepedente (a qual você não controla, cujo resultado será sempre um dado para você) e a variável "gastos" fosse a dependente, ou seja, a que deverá ser ajustada conforme a primeira variável. Dependendo de quanto eu ganho, eu decido quanto gastar. Faz muito sentido - e aliás, quem não faz isso, deve estar com sérios problemas financeiros! - mas acho que isso gera um problema, embora óbvio, pouco visível.

Acho que meus avôs tinham muito medo de passar fome; de a situação econômica deles se deteriorar a tal ponto de não ter comida para por na mesa. Não era um medo particular deles, era o medo de toda uma geração de um país onde muito poucos eram "doutores" e a imensa maioria era uma grande classe média baixa. 40 anos de crescimento econômico depois, existem muitas diferenças no horizonte econômico que a minha geração está inserida. (Claro que, num país como o Brasil, altamente desigual, existem diferenças de horizontes gritantes de acordo com a classe social - aqui estou me referindo à classe social na qual eu e a maioria dos meus amigos está inserida). O risco de "passar fome" é muito menor do que era no passado; há uma classe média pujante no Brasil. Pessoas com uma boa formação, em faculdades de primeira linha, falando uma ou duas línguas estrangeiras, com alguma experiência em uma ou duas funções, e com disponibilidade de trabalhar, dificilmente vão passar fome. Há crises econômicas, há desemprego para trabalhadores de mais idade, sim, há isso tudo; o que estou querendo dizer é que o risco que esse grupo de pessoas está exposto não é o de total aniquilamento econômico - passar fome, ir morar embaixo da ponte. É o risco do fracasso; é o risco de não ser bem-sucedido, de ganhar pouco e contar os centavos no final do mês, de ter dificuldade de pagar o colégio dos filhos, de não fazer viagens de férias legais, de ficar 10 anos sem poder trocar de carro. Quando alguém dessa classe se mata para se qualificar melhor para o futuro, lambe o saco do chefe para ficar bem na foto e toma outras atitudes para "preservar a carreira", é nisso que está pensando. Esse medo pode vir até camuflado do medo de perder o emprego e nunca mais arrumar outro, mas no fundo esse não é um medo realista - já o medo de demorar 2 anos para arrumar algo e ter que aceitar um emprego ganhando metade do que ganha hoje, sim. Uma brincadeira entre minha irmã e eu é que "se tudo der errado, eu presto concurso público" - e no final, essa é uma saída mesmo - para quem uma boa formação e sempre esteve acostumado a estudar é mais fácil.

Isso tudo para dizer que, para a maioria das pessoas que eu convivo, a busca de melhoria financeira é muito menos uma necessidade primária e mais a busca de mais conforto - não, por isso, menos válido. E aí, voltando para o começo da conversa, o gasto vai sempre acompanhando o aumento gradual do ganho. Quantas vezes você não já viu - ou viveu - aquela situação: a pessoa tem aumento de salário, nos primeiros 2 meses é uma beleza, mas no terceiro mês já aumentou seu gastos proporcionalmente e continua não sobrando nada no final do mês? Meu gasto está totalmente balizado pelo meu ganho - para cima, que é absolutamente compreensível, mas também para baixo: porque gastar menos se eu posso gastar mais? Se ganhar dinheiro segue a lógica do "quanto mais melhor", e o gasto vai sempre acompanhando a renda, então "quanto mais ganho, mais gasto". Um raciocínio que eu mesmo já usei muitas vezes é aquele do "ah, é para isso que eu trabalho tanto" para justificar um consumo (uma roupa, um restaurante mais caro) fora do meu nível de consumo habitual. O ser-humano se habitua a qualquer coisa, mas se habitua mais rapidamente ao que é confortável - rapidamente você já está habituado aquele nível de conforto que o seu nível de renda atual consegue proporcionar.

Agora, o quadro está completo: o sujeito começou a sua vida profissional da maneira que todo mundo começa - por exemplo, arrumou um estágio enquanto fazia a faculdade. Foi indo, em algum momento foi efetivado, ficou feliz com seu salário aumentado. Mudou de empresa, foi promovido, gradualmente sua renda foi melhorando e, naturalmente, o nível de consumo acompanhou a melhora da renda. No começo alguns aumentos de gastos tinham aquela lógica do "é para isso que eu trabalho", depois foi se acostumando com aquele padrão de consumo.Só conseguia aguentar a volta para casa depois de 10h de trabalho porque seu carro era novo e confortável. Vestir aquele terno legal e sentir-se bonito / importante compensava um pouco o mal-estar. Jantar em um bom restaurante tomando um bom vinho trazia uma alegria que dava ânimo para continuar. Em suma, o padrão de consumo passou a ser o que fazia o sujeito suportar o desgaste do trabalho. Só que, ao passar do tempo, o que era consequência passa a ser causa: trabalha-se para manter aquele padrão. Quando o sujeito sente-se cansado e cogita a idéia de tentar uma mudança, todo aquele padrão cristalizou-se e ele acredita, piamente, que precisa daquilo tudo para viver. O que iniciou-se como uma recompensa passa a ser premissa.

Eu sei que é utópico, extramamente hipotético. Mas a dinâmica renda x outros fatores poderia ser sim uma via de influência recíproca. Todo mundo quer ganhar mais; mas se meus gastos estão estabelecidos pelo que faz sentido para mim - e não pelo "quanto mais melhor", fica mais fácil dosar melhor o quanto de esforço e sacrifício está sendo feito por aquele dinheiro.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Bush x Obama?

Por ocasião da visita do Obama ao Brasil - toda a pompa, entusiasmo da pessoas etc - e, em comparação à visita de Bush tempos atrás - onde o que mais se via eram manifestações de repulsa - vem uma pergunta: porque nós, brasileiros, de forma geral, gostamos tanto do Obama e odiamos tanto o Bush?

Eu, particularmente, gosto do simbolismo que a eleição do Obama carrega: é significativo que os EUA tenham eleito o primeiro presidente negro de sua história - com um bônus do fato dele ter ascendência arábe. Além disso, Obama é 3x mais carismático que Bush; tem aquele magnetismo pessoal e a capacidade de encantar platéias que figuras como o Lula têm - embora o americano tenha muito mais preparo e formação intelectual do que o brasileiro, pois se fosse diferente os EUA nunca o teriam eleito. Também não tenho nenhuma simpatia por Bush e, ademais, na minha ignorância de quem conhece as coisas por um elemento aqui e outro ali, acho que fez um governo apenas mediano. Diferenças essa a parte, do ponto de vista de uma nação estrangeira avaliando um governante de outro país, cabe fazer análises objetivas.

Há uma tendência de aproximação, em termos de política externa e comercial, entre Brasil e EUA - mas me parece que essa aproximação deve-se muito mais a uma sinalização da presidente Dilma de alterar o eixo da política externa brasileira do que de uma "boa vontade" do governo americano. No aspecto de política comercial, nada mudou e, provavelmente, nada mudará - Obama, mesmo que quisesse, teria pouca força para mudar as regras de subsídios que tantam atrapalham nossas exportações para lá. Bush era odiado mundialmente, em especial, pela invasão do Iraque. Obama ainda não teve a oportunidade de lidar com uma situação externa tão complexa quanto a que se seguiu após 11 de Setembro; nas ocasiões que apareceram nos dois últimos anos, o que vimos foi uma atuação um tanto atrapalhada: Honduras, Wiikleaks, Egito e, agora, Líbia. Esse desconforto parece vir do fato de Obama ter que sambar com dois ritmos ao mesmo tempo: a obrigação de "ser diferente", onde toda a sua campanha foi embasada, e a realização de que a função de presidente da nação mais poderosa do mundo traz complexidades acima do que pode-se imaginar. Por exemplo: fechar Guantánamo era uma plataforma de campanha que teve de ser, na melhor das hipóteses, postergada, pela complexidade (ou pela falta) da solução.

A realização de que Obama pode ser uma casca mais bonita do que eficaz pode estar acontecendo ao povo americano - vide o resultado das últimas eleições, onde os democratas tomaram um verdadeiro cacete. Bom, mas ele não fez nada de bom? Tem a aprovação do sistema de saúde, que do ponto de vista humanitário e de uma sociedade menos cruel, faz todo o sentido - mesmo que contrarie aspectos muito profundos da filosofia de vida americana. Mas não deixa de ser curioso que um povo como o brasileiro, que elegeu para mais quatro anos um grupo político que, nos últimos anos, tratou a saúde pública com verdadeira incompetência, aprecie um governante estrangeiro pelos seus avanços no campo da saúde.

Sendo assim, porque Bush era o diabo e Obama parece ser algo próximo de Deus? Não são, ambos, expressão de uma série de aspirações do mesmo povo americano, em um dado momento? A resposta que me parece mais clara é o fato de que, política, em especial no Brasil, é um exercício mais de paixão e de adoção de tendências da moda do que efetivamente um exercício da razão. No Brasil, é legal ser de esquerda, torcer pelo "socialmente justo" - seja lá o que isso queira dizer. Liberal, hoje, é o que era comunista nos anos 50 - come criancinha, filho do capeta etc. O engraçado é que liberal, nos EUA, é justamente o que muita gente aqui acha bacana - a antítese do conservador, mais identificado com os democratas. Os termos não tem mais sentido em si, adotam o sentido que cada um quiser em cada contexto. Obama é negro, jovem, tem uma linguagem fácil, é carismático - todas características que lhe conquistam votos de confiança e o permitem, ao contrário de Bush, começar o jogo contando com a boa vontade da opinião pública. Mas exercer a função que exerce exige muito, mais muito mais do que isso. Os que temiam que ele não estivesse preparado para o cargo podem estar tendo a confirmação dos seus medos. A averiguar.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Godfather

Cena do filme "O Poderoso Chefão" (The Godfather). As cinco famílias da máfia de Nova York estão em guerra. Tudo começou após um atentado à vida de Vito Corleone (Don Corleone), como tentativa de fazer que seu filho Sonny, próximo na escala hierárquica, aceitasse uma proposta de negócios. Enquanto Vito ainda estava no hospital, seus filhos entenderam que a única maneira de proteger a vida do seu pai era matar esse chefe do crime que estava por trás da tentativa de assassinato. Michael, o filho mais novo, encarregou-se da tarefa e, por também ter tido que matar um capitão da polícia que atuava como guarda-costas desse chefe do crime, teve de fugir e se refugiar na Itália. Muitas coisas aconteceram e, quando Vito conseguiu retomar o controle da família, decidiu que sua prioridade seria trazer Michael de volta aos Estados Unidos. Para isso, ele convoca uma reunião com os chefes de todas as famílias para propor a trégua. É essa a cena a qual vou me referir.

Na reunião, pontos de vista são expostos, um quer uma coisa, outro quer outra; para alcançar a "paz", Vito aceita a sua participação nos negócios que, inicialmente, tinha recusado, contrariando, inclusive, seus próprios princípios. Mas negocia seus termos, dizendo que seu filho Michael, que está foragido, está retornando para casa, e ele quer que isso aconteça em segurança. E, com a sua sabedoria, acrescenta (eu não lembrava exatamente as palavras, mas achei melhor copiar o texto como é) "mas eu sou um homem supersticioso; se algum acidente infeliz acontecer a ele - se ele receber um tiro na cabeça de um policial, se ele se enforcar na sua cela da prisão, até se um raio cair nele, então eu vou culpar alguém dessa sala, e isso é imperdoável. Tirando isso, juro pela alma dos meus netos que não serei eu a quebrar a paz que nós estabelecemos hoje".

Lembrei dessa cena em uma conversa que tive recentemente. No contexto do filme, claro que isso tem a ver com o 'modus operandi' da máfia (ou pelo menos com a imagem da máfia que nos chega por livro e tevê): aquela de "fazer as coisas parecerem como acidentes". Vito não podia correr nenhum risco de alguém facilitar, de nenhuma maneira, algo que pudesse causar a morte de seu filho. E ele precisava encontrar uma maneira de deixar isso claro, de tornar todos que estavam naquela sala responsáveis pela segurança do seu filho, sob risco de quebrar a paz que estava estabelecidda - e o fez de forma brilhante.

E o link com essa cena que apareceu na conversa que tive recentemente é o mesmo link que já me apareceu outras vezes. Há situações que realmente não importa a intenção: não importa se a pessoa que fez a cag* quis fazer, se ela só foi descuidada, se ela só teve azar. Tem horas que a gente não tem - ou não pode se dar ao luxo de ter - a energia para descobrir; muitas vezes não é nem possível. Mas se a hipótese mais benevolente para uma pessoa que só faz cag*, ou só se dá mal, é que ela é "muito azarada" - bom, sai com seu azar para lá! Já trabalhei com pessoas assim, já tive "amizades" assim, e é uma m*...tem uma hora que vc não quer saber, e tudo o que você pode fazer é manter distância - assim como Vito Corleone não podia correr o risco de ver seu filho morto para depois tentar descobrir se alguém teve algo a ver com isso. Afinal, "i am a superstitious man...'

sexta-feira, 11 de março de 2011

Aposentadoria

Esses dias conheci um psicanalista de mais de 80 anos que, apesar da aparente falta de necessidade financeira para tanto, ainda trabalha pelo menos 7 horas por dia. Noutro dia tive aula com um professor - uma verdadeira sumidade na sua área de pesquisa - de mais de 70 anos, e não me lembro de ter tido uma aula com alguém tão apaixonado pelo assunto sobre o qual estava falando como ele.

Por outro lado, nos meus 10 anos de vida corporativa, tive contatos com algumas pessoas que se aposentaram ou estavam próximas da aposentadoria. Algumas pessoas aguardavam ansiosamente o dia do tão esperado descanso; alguns gostariam de poder descansar, mas a preocupação com a questão financeira falava mais alto e a proximidade da aposentadoria era motivo de angústia. Quase todos me causavam a impressão de que tinham, fácil fácil, pelo menos 10 ou 15 anos para queimar na empresa, trabalhando com muita produtividade. Cheguei a ter contato com dois ou três que tinham se aposentado, e o relato era o mesmo: após aproveitar um ou dois anos de descanso, estavam procurando algo para fazer, para sentirem-se produtivos. Um deles estava até fazendo trabalhos voluntários, mas ressentia-se de estar cortando batatas, quando poderia usar muito mais do intelecto e da experiência que acumulou durante quarenta e poucos anos de mercado financeiro.

A primeira diferença que vem à cabeça entre os casos que descrevi no primeiro parágrafo e os do segundo é: enquanto os primeiros tem verdadeira paixão pelo que fazem, os segundos tinham no trabalho apenas um meio de vida. A segunda diferença, menos óbvia, é que a profissão dos primeiros permitia um ritmo geral de vida mais adequado às exigências da idade do que a dos segundos, que trabalhavam em empresa. Qualquer um que trabalhe 10 horas por dia e leve todo o dia umas três horas no trânsito provavelmente está contando os dias para mudar de vida...

Essas constatações vem ao encontro de algumas impressões que eu tinha quando trabalhava em empresas. Cada vez mais a pressão sobre os trabalhadores de uma certa idade aumenta: os pacotes de estímulo à aposentadoria, para dar lugar a trabalhadores mais jovens, vem cada mais cedo. No meu último emprego cheguei a ver um pacote destinado a pessoas com 50 anos! Poxa, 50 anos o cara é praticamente um bebê eheehh...tem muita lenha para queimar. Por outro lado, os trabalhadores dessa idade tem sentimentos diversos sobre a situação: muitos anseiam, há muito tempo, esse descanso. Se a condição financeira lhes é favorável (talvez mais por sua baixa expectativa de renda do que efetivamente por uma condição financeira muito boa), a novidade é bem-vinda. Mas isso não exclui a necessidade de ainda sentir-se útil, produtivo. Muitos enxergam essa situação como a oportunidade de, finalmente, fazerem algo a que já gostariam de estar se dedicando há muito tempo. Não consigo deixar de pensar que, fosse o trabalho, de forma geral, menos desgastante, talvez nem esses quisessem se aposentar - talvez usassem o tempo livre que já tem para se dedicarem, satisfatoriamente, a outras coisas.

Eu entendo o ponto de vista das empresas; trabalhadores de uma certa idade, de forma geral, custam caro - os salários foram inchados, nem que tenha sido apenas pelos consequentes dissídios. Muitos não tem o mesmo gás e disposição para se submeter a certas situações de trabalho que os mais novos tem. E, principalmente, a legislação é um forte empecilho: você não consegue readequar a situação do trabalhador para que a situação seja proveitosa para os 2 lados. Digamos, que ao se aposentar, o trabalhador diminuísse sua carga horária para algo como 5 horas por dia - e recebesse o salário proporcional. A empresa, com o custo menor, continuaria a contar com a experiência dele, enquanto o trabalhador, ainda sentindo-se produtivo, e com mais tempo para fazer outras coisas, poderia produzir por muito mais tempo.

O conceito de idade produtiva mudou muito. Minha vó tem 80 anos e encontrou energia para ser síndica do seu prédio. Meu pai já passou dos 60 e ainda tem pelo menos 20 anos de trabalho pela frente. A minha geração deve chegar aos 90 anos com capacidade produtiva boa. Essa separação da vida em fases - uma produtiva e a outra para ficar moscando em casa - não faz mais sentido. Como sociedade, está na hora de pensarmos em forma de utilizar toda essa força produtiva em prol da própria sociedade - o que chegaria, eventualmente, a diminuir a necessidade de esfolar o couro dos que estão na sua fase produtiva. Em vez da vida ser um "rala, se esfola, para depois descansar", a contribuição de cada um na sociedade seria mais contínua e menos penosa.

terça-feira, 1 de março de 2011

Times brasileiros na libertadores

Escrevi esse post uns 2 dias depois da derrota do Corinthians pro Tolima. Acabei não postando e estou postando agora, exatamente como tinha escrito na época. De lá para cá há fatos a serem considerados: Adilson não é mais técnico do Santos, Flu iniciou muito mal a competição, Cruzeiro começou arrasando - fatos que podem tornar as análises mais ou menos furadas. Ainda sim quis postar tal qual escrevi naquela época...

* * *

Com a infeliz desclassificação do meu time na libertadores, resta-me analisar os outros brasileiros que disputarão o torneio. Esses dia assisti um programa esportivo no qual os jornalistas faziam esse análise, e a unanimidade afirmou que Santos e Fluminense são os times brasileiros favoritos para a competição. Tenho lá as minhas dúvidas. Mas que fique claro que, uma vez que Palmeiras e São Paulo estão fora, a análise é realmente racional, e não birrinha de torcedor. Não, não considero o Santos rivaaaaal do Corinthians e tenho até certa simpatia pelo time da baixada.

Fluminense: escrevi um post aqui sobre pontos corridos. O Fluminense é o campeão brasileiro, na minha opinião, em grande parte por ter contratado um técnico especialista nessa competição. Esse tipo de competição, na minha visão, não premia o time com mais capacidade de decisão, de entrar em um jogo decisivo com sangue nos olhos e conseguir a vitória a qualquer custo - que é o tipo de capacidade que o mata-mata exige. Há jogadores bons no Fluminense - Deco, Fred, Conca (embora eu discorde da maioria e ache esse último um belo dum pipoqueiro). Mas acho que o Fluminense tem 3 grandes problemas; o primeiro, o técnico, que é tão bom em pontos corridos quanto é ruim em mata-matas (vide as 4 desclassificações contra brasileiros quando dirigia o São Paulo, sendo que o São Paulo, nos pontos corridos, tinha sido muito superior a esses mesmos adversários); o segundo, é que o time do meio para trás é inseguro, um paradoxo para as características do Muricy, que monta times com defesas muito eficientes. O terceiro, é que não vejo no Fluminense muitos jogadores capazes de segurar uma barra de um jogo pesado de libertardores, ou com muita experiência no torneio. A ver.

Santos: acho que a diretoria do Santos vem tomando decisões acertadas; o trio ofensivo com Ganso, Elano e Neymar tem tudo para ser infernal. Acho que poderiam ter contratado um centroavante melhor - não boto fé no Diogo nem no Keirisson, se tivesse conseguido trazer o Ricardo Oliveira, por ex, seria difícil segurar...Acho o Santos um time com melhor condições que o Fluminense; ainda sim, há alguns poréns; acho que poderiam ter contratado um zagueiro; a defesa, embora não seja ruim, não teve muitas oportunidades de ser testada, nem no ano passado. O time do Dorival ano passado compensava uma eventual insegurança defensvia com muito ataque - era um 433 com só 1 volante de marcação! o time encaixou muito bem e soube se comportar quando enfrentou adversários grandes. Não sei como esse time do Adilson vai se comportar nessas situações; libertadores é uma competição onde se "joga" com a bola no chão muito menos do que os campeonatos no Brasil. Uma dúvida é se os meninos terão a maturidade nos jogos pegados, difíceis. A atitude do Neymar tem me agradadado nesses jogos do sub-20, vamos ver se ele consegue manter a cabeça fria, pq do jeito que ele joga vai ser caçado em campo. O Santos pode estar cometendo alguns dos erros que o Corinthians cometeu em 2009: passeou no segundo semestre e trouxe peças importantes para encaixar no próprio ano da disputa. A demora para dar liga pode custar caro. A última coisa é o Adilson; como corinthiano, sei da capacidade dele de fazer besteiras. Os cruzeirenses também não são muito fãs dele, embora ele tenha sido vice-campeao da Libertadores. Há sempre o risco dele querer inventar alguma maluquice e ferrar o que tava bom.

Inter: engraçado os comentaristas desse programa terem deixado o Inter de fora. Ultimamente tem crescido uma rixa entre Inter e Corinthians, e admito que não tenho nenhuma simpatia pelo colorado. Mas pra mim continua sendo o grande favorito brasileiro esse ano. Na última década foi bicampeão do torneio; o time pode não ser brilhante, mas é muito equilibrado, tem um meio-de-campo muito forte. Ano passado a diretoria abusou do direito de fazer cag*, trocou de técnico 2 vezes, e ainda sim foram campeões. Celso Roth é um técnico que, na minha opinião, goza de muito menos prestígio do que merece. Jogar no beira-rio costuma ser complicado.

Grêmio: outro time que ninguém dá muita coisa, mas acho que pode surpreender. Não gosto do Renato Gaúcho, mas ele já foi vice da libertadores. O Grêmio foi um dos melhores times no segundo turno do brasileiro, e um visitante encardido - parece que o Renato acertou o jeito de jogar fora de casa. Perder o Jonas foi uma besteira; mas o Grêmio é um time que gosta desse tipo de competição, sempre cresce, e é muito difícil jogar no Olímpico. É aquele time que, quando olhar, já tá na semi, e daí pro título são 4 jogos.

Cruzeiro: bom, não fosse o Cuca...acho o time do Cruzeiro muito bem montado. Nos jogos finais do brasileiro o time mostrou muita força: sabia jogar muito bem fora de casa e impor seu ritmo nos jogos em casa. O mineirão vai continuar fazendo falta e seria um verdadeiro milagre o Cuca conduzir algum time a esse título, pelo seu perfil, digamos, um tanto quanto derrotado. Se ele der a sorte de não enfrentar muitas situações complicadas pode ser que chegue longe.

Corinthians: tolimination-tion-tion...ehehe, que m*!!

No mais, acho muito difícil o título não ficar, novamente, com um brasileiro.