terça-feira, 24 de agosto de 2010

Sobre pós-graduação.

Eu tenho conversas frequentes com algumas pessoas mais próximas sobre como o mundo moderno enlouqueceu, sobre como seguimos caminhos e tomamos decisões completamente baseados no que o “rodamoinho frenético” da vida moderna nos manda fazer. A questão que vou relatar agora tem a ver com isso.
Quando eu deixei a organização na qual trabalhei por 9 anos, eu ocupava um cargo de relativo destaque dentro da minha área. Pondo isso em números: era uma superintendência de 50 pessoas; abaixo do superintendente, havia 5 gerentes de grupo, e respondendo diretamente para os gerentes de grupo eram 9 pessoas (eu inclusive). Significa que eu estava entre os 30% de maior influência dentro dessa hierarquia, o que, na verdade, não é nada demais - só serve ao propósito do que eu quero pontuar: eu tinha 27 anos, e as pessoas que estavam em posição parecida com a minha, tanto na minha área quanto nas áreas ao lado, eram mais velhas do que eu. Quer dizer, algumas com 30 anos, outra tantas com trinta e poucos, muito mais freqüentemente pessoas de quarenta anos ou mais. A minha posição, que era gestor de uma equipe de 3 pessoas e que cuidava de 4 produtos, talvez fosse o início de uma fase de carreira onde você comece a tomar decisões um pouco mais importantes, onde você precise de um pouco mais de habilidades de gestão, de pensamento estratégico. E a freqüência de idade dessas pessoas nessa posição – ou superior – era fortemente à partir dos 30 anos.
Isso me leva a outra ponto. Quando se pensou mais fortemente nos cursos de extensão, como uma pós-gradução, ou até um MBA, eu imagino que a idéia era: vamos pegar pessoas que estejam – ou pelo menos estejam se preparando para tanto – em funções de algum comando ou decisão dentro de uma empresa, reuní-las em um ambiente, ensiná-las conceitos que serão importantes em suas funções e permitir a elas que troquem experiências. Nesse contexto, eu imagino que uma pessoa comum que fosse fazer um curso de extensão fosse algo do tipo: alguém que se formou com seus 22 anos, já estava no mercado de trabalho, adquiriu um pouco de experiência profissional e lá pelos seus 28 ou 29 anos, estando ou prestes a estar em alguma posição onde pensamento estratégico fosse algo importante, fosse se dedicar – tempo, dinheiro, energia – a um curso de extensão. Essas pessoas teriam seus 7 ou 8 anos de experiência profissional, teriam passado por situações diferentes, conhecido pessoas diferentes, teriam experiências para trocar e maturidade para absorver conhecimento ou entender as experiências dos outros. Haveria um ambiente que possibilitaria a efetiva formação de profissionais mais preparados para os desafios que a sua nova fase da carreira estaria propondo. Importante: estou falando especificamente de cursos de extensão na área de administração, que visam justamente formar novos gestores, pessoas que atuam em empresas em áreas de liderança. Acho que cursos de especialização de caráter técnico – que médicos, psicólogos, profissionais do mercado financeiro etc fazem para adquirir mais conhecimentos específicos da sua área têm função completamente diferente.

E o que a gente vê na prática? A maioria das pessoas que está fazendo pós-graduação são jovens dos seus 23 ou 24 anos, recém-formados. Meninos, com experiência profissional que não passa de 3 anos, recém efetivados da sua condição de estagiário, que literalmente ocupam a base da pirâmide profissional da empresa, já ocupando 3 noites da sua semana em aulas sobre gestão estratégica e coisas do tipo. Lembro fortemente da impressão que isso me causava: imaginem um analista júnior, que fazia atividades completamente burocráticas, que pelo caminho natural levaria pelo menos uns cinco anos para se aproximar de uma posição onde precisaria efetivamente se desenvolver nesse tipo de conceito, tendo aulas sobre assuntos que deviam soar – para ele e para os seus colegas de turma - como chinês antigo para um árabe. Se você, como eu, fez faculdade à noite enquanto trabalhava de dia, sabe do que eu estou falando: qual o tamanho da vontade que você tinha para acabar logo a faculdade e ter um pouco de tempo livre? Para poder fazer uma academia? Para retomar o curso de inglês que você fazia? Para poder fazer happy-hour com seus amigos durante a semana? Para fazer aquela aula de violão que você queria fazer faz tempo? Para chegar em casa e relaxar no sofá depois de um dia duro?

Pois é. Mas boa parte desse pessoal está emendando uma pós-graduação. Está gastando um dinheiro que, nessa época, faz diferença. Está investindo 3 noites por semana nisso, está saindo do escritório essas 3 noites por semana as 18 (ou mais cedo) por conta disso, está deixando de fazer as coisas que mencionei acima. E por que? Porque disseram para eles (o que não deixa de ser verdade) que o mercado exige isso, que quem não tiver uma pós-graduação será passado para trás, que precisamos estar sempre nos atualizando.

Veja bem, não sou contra o estudo, acho até que qualquer estudo é melhor que nenhum estudo – não é esse o ponto. Nem que você não deva se sacrificar em algum momento da sua vida para se preparar melhor e colher os frutos futuramente – também não é esse o ponto. Mas você, que trabalha em empresa e compreendeu do que eu estou falando, que conhece pessoas de 23 anos recém-formadas, pode me responder: imagine uma sala cheia dessas pessoas, com essa parca experiência de vida e profissional própria da faixa etária, recebendo conhecimentos e discutindo sobre os assuntos que, teoricamente, deveriam ser abordados numa pós-graduação. Você realmente acha que isso vai prepará-los para uma melhor vida profissional? Do ponto de vista de sociedade, do humano, inclusive do prático, é razoável “forçar” esse pessoal todo a investir nisso dessa maneira tão precoce com a qual a sociedade os está forçando? Não acho que isso os fará profissionais melhores; acho que a pós-graduação ou MBA, da maneira que foi – ou deveria ter sido – pensada, poderia ser um instrumento muito legal na formação de profissionais mais preparados. Mas da maneira como a sociedade se organizou nesse aspecto, por conta da crescente competitividade do mundo moderno, acho que estamos apenas formando pessoas mais neuróticas e mais embaladas pelo rolo compressor da vida contemporânea.