sábado, 9 de outubro de 2010

Sobre reacionários e elitistas

Petistas e partidários "de esquerda" em geral costumam argumentar que "as elites" são contra um projeto político "popular", que possibilite a ascensão econômica dos mais pobres porque são contra a mudança, porque querem manter seus privilégios de elite econômica e que, portanto, a idéia dos mais pobres terem acesso a coisas que eram exclusivas de uma certa classe é muito assutadora. Acho que, até certo ponto, tem um fundo de razão aqui, mas não é esse o ponto do texto. O problema é o exagero de assumir essa posição. Quando se atribui a uma discordância política uma premissa emocional e individual, está desqualificando-se o debate, está negando-se ao adversário a possibilidade de discordar objetivamente, tecnicamente. E claro, isso é arrogância. Há as mais variadas teses, até embasadas "cientificamente", de que toda a estrutura burguesa cria argumentos e lógicas para desqualificar movimentos que possibilitem a melhoria social etc. Tente discutir contra isso e você será, automaticamente, reacionário e contra a mudança.
Então se vale para um lado, vale para o outro também. Há claramente um grande fator emocional envolvido nessa visão de política. Uma coisa que me chama a atenção é a total aversão ao PSDB, por exemplo. São chamados de elitistas, de reacionários, que formam a elite que mantém a desigualdade há anos no Brasil bla bla blá. Eis um ponto que não há nada de racional e objetivo. Pois vejamos...

O PSDB nasceu no final da década de 80, como uma deserção (à esquerda) do PMDB - partido que, na época, era símbolo da luta pela democracia no Brasil. Chegou ao poder muito por consequência de um projeto de extremo apelo popular: o plano real, que finalmente acabou com a inflação. Inflação, aliás, que é um horror justamente para as camadas mais pobres, sem emprego formal, desbancarizadas, que tem seu poder de compra aniquilado com o passar dos dias. Em vários aspectos, podemos até considerar os 8 anos de governo FHC com mais medidas de real impacto às camadas menos favorecidas do que os últimos 8 anos. É verdade que FHC, em especial no seu primeiro mandato, governou junto com setores mais conservadores do PFL, como ACM. E o PT tem hoje em sua base de apoio os Sarney do Maranhão, os Collor de Alagoas, os Arraes de Pernambuco, os Gomes do Ceará, todas famílias tradicionalíssimas da elite dos seus estados que estão há anos perpetuando a pobreza (sem contar Maluf, Suplicys e outros "pobrinhos"). As maiores mamatas e roubalheiras acontecem em esquemas com ou dentro do Estado; FHC inicou um processo de racionalização e diminuição do estado; reconheceu os esqueletos, assumiu as dívidas dos estados e refinanciou-os, culminando com a lei de responsabilidade fiscal (na prática, protegendo a população dos seus próprios governantes); criou as agências reguladoras. Governo Lula voltou a inchar o estado, contratar sem concurso e degradar as instituições democráticas, tornando assim a população - em especial a mais pobre - cada mais refém dos seus governantes. Se no começo da década de 90 um telefone era coisa de rico - custava 2 mil reais e podia-se esperar uns 2 anos por uma linha - hoje, após a privatização das teles e consequente boom de investimentos no setor, qualquer um pode comprar um pré-pago por 10 parcelas de 10 reais. Privatizações essas que foram muito criticadas pelo PT, criando até o mito da privataria que jogou reputações no lixo. Na abeducação, o governo FHC alcançou ótimos resultados na universalização da educação básica - embora com sérios problemas na qualidade. Sabemos que a educação é a única maneira sustentável de reverter um ciclo de pobreza. Qual o resultado prático do governo Lula na educação? Na fundamental e média, quase nada. Só isentou faculdades ruins de imposto se dessem bolsa para alunos ainda menos qualificados e fez muita propaganda disso. A política econômica do Malan, tão criticada por ser chamada de "política pros banqueiros", não só foi mantida como foi a principal razão da economia ir tão bem e render tantos frutos eleitorais para Lula; banqueiros e grandes empresas nunca estiveram tão felizes. Ok, tem o bolsa-família; mas os primeiros programas de distribuição de renda foram criados no governo FHC, e a idéia de junção desses programas em um só foi do ex-governador de Goiás, o tucano Marconi Perillo (há vídeos do Lula agradecendo-o pela idéia espalhados por aí, é só procurar).

Isso tudo para dizer: pode-se fazer variadas críticas aos governos tucanos, mas os dados estão aí para provar que de "elitistas", de governar para "os ricos", não há nada de objetivo. Minha impressão é que seja fundamental para um projeto autoentitulado de "popular", "dos pobres", criar essa contradição, acirrar esse sentimento de "nós pobres" contra "eles ricos". Senão o discurso perde a força; não interessa apenas uma discussão objetiva de quais caminhos levam a quais objetivos, até porque, muitas vezes, falta competência para essa discussão. Questões emocionais e deixar de lado questões objetivas para apelar para um suposto princípio não é exclusividade das chamadas "direitas".

Um comentário:

  1. Amei seu texto...tenho vontade de passar o link pra todas as pessoas que eu conheço...claro, explicativo, didático e inteligente.
    Beijos!

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